Dono da segunda maior população negra do globo, o Brasil, por muito tempo, tratou a “mama” África como a sua versão homônima da canção de Chico César: “Vai e vem, mas não se afasta de você”. Nossa diplomacia vive se “lembrando” e se “esquecendo” do continente. Durante o século XX, pelo menos até 1960, a política externa brasileira ignorou o continente africano, voltando-se para a América e a Europa. “Mas, mais recentemente, entre 1985 e 2006, essas relações entram num movimento de intensidade variável e contínuo, com períodos de ambivalências e incertezas, de acentuado declínio entre as décadas de 1980 e 1990, esboçando recuperação nesta virada de século”, observa Cláudio Oliveira Ribeiro, professor do curso de relações internacionais da PUC-SP e autor da tese de doutorado Relações político-comerciais Brasil-África, defendida no ano passado na USP. Um vaivém que, nota ele, “se ajusta às variações observadas no plano internacional e na própria agenda diplomática brasileira”. O Atlântico, como já observou o diplomata e africanista, já foi um rio a separar Brasil e África e poderia voltar a ser.
A “mama” África sofreu as penas e preconceitos de ser “mãe solteira”, romantizada pela mesma razão. Mesmo com a recente priorização, na esfera do Atlântico, de uma política para o continente africano, o pesquisador adverte que “a construção de uma política africana embasada na premissa de laços maternos pressupõe uma visão distorcida da própria África, em que o Brasil, por meio de um discurso pretensamente progressista, julga-se capaz de ajudar os países africanos, promovendo uma política missionária”. Para Ribeiro, a política externa para o continente não pode ser compreendida sem o reconhecimento dos interesses estratégicos do continente, sem que isso signifique “considerar estritamente os interesses brasileiros nessa relação”. Se no governo atual o presidente Lula e o ministro das Relações Exteriores realizaram um roteiro de visitas e acordos sem precedentes, que revela a nova dinâmica da relação entre Brasil e África, “constata-se que o processo de formulação da política externa para o continente ainda é desprovido de embasamento societário”.
Lista de comentários
Verified answer
Resposta:
Dono da segunda maior população negra do globo, o Brasil, por muito tempo, tratou a “mama” África como a sua versão homônima da canção de Chico César: “Vai e vem, mas não se afasta de você”. Nossa diplomacia vive se “lembrando” e se “esquecendo” do continente. Durante o século XX, pelo menos até 1960, a política externa brasileira ignorou o continente africano, voltando-se para a América e a Europa. “Mas, mais recentemente, entre 1985 e 2006, essas relações entram num movimento de intensidade variável e contínuo, com períodos de ambivalências e incertezas, de acentuado declínio entre as décadas de 1980 e 1990, esboçando recuperação nesta virada de século”, observa Cláudio Oliveira Ribeiro, professor do curso de relações internacionais da PUC-SP e autor da tese de doutorado Relações político-comerciais Brasil-África, defendida no ano passado na USP. Um vaivém que, nota ele, “se ajusta às variações observadas no plano internacional e na própria agenda diplomática brasileira”. O Atlântico, como já observou o diplomata e africanista, já foi um rio a separar Brasil e África e poderia voltar a ser.
A “mama” África sofreu as penas e preconceitos de ser “mãe solteira”, romantizada pela mesma razão. Mesmo com a recente priorização, na esfera do Atlântico, de uma política para o continente africano, o pesquisador adverte que “a construção de uma política africana embasada na premissa de laços maternos pressupõe uma visão distorcida da própria África, em que o Brasil, por meio de um discurso pretensamente progressista, julga-se capaz de ajudar os países africanos, promovendo uma política missionária”. Para Ribeiro, a política externa para o continente não pode ser compreendida sem o reconhecimento dos interesses estratégicos do continente, sem que isso signifique “considerar estritamente os interesses brasileiros nessa relação”. Se no governo atual o presidente Lula e o ministro das Relações Exteriores realizaram um roteiro de visitas e acordos sem precedentes, que revela a nova dinâmica da relação entre Brasil e África, “constata-se que o processo de formulação da política externa para o continente ainda é desprovido de embasamento societário”.
espero ter ajudado