REFERENTE AO TEXTO ABAIXO:
Sou por acaso o guardião do meu irmão?
O professor Van der Laan gentilmente me enviou vários estudos sérios e perspicazes que
tratam, como ele ressaltou, de “importantes questões sobre o serviço social nos Países Baixos”.
Estou grato – aprendi muito com ele a respeito dos problemas que ocupam a atenção dos
assistentes sociais em seu país. Mas fiquei particularmente grato pela tranqüilidade que obtive
com minhas leituras: as preocupações dos assistentes sociais holandeses não são diferentes do
que sentem as pessoas dedicadas ao serviço social em outros países europeus. Em seu próprio
artigo, o professor Van der Laan apreendeu muito bem o já difundidosentimento de desconforto
ao indicar que o Estado de bem-estar social está sob ataque, acusado de fornecer redes de
dormir a seus tutelados, ao passo que redes de segurança genuínas deveriam atuar como um
trampolim. Em outras palavras, o Estado de bem-estar social é acusado de não preparar sua
própria demissão.
A tarefa do serviço social deveria ser, dizem, livrar-se dos desempregados, incapacitados,
inválidos e outras pessoas indolentes que, por uma razão ou outra, não podem ganhar seu próprio
sustento e assim dependem da ajuda e do cuidado sociais para sobreviverem; e isso
evidentemente não está acontecendo. Como o serviço social, dizem, deve ser avaliado como
qualquer outra ação humana, ou seja, por sua planilha de custo-benefício, ele não tem, em
sua presente forma, “um sentido econômico”. Ele só iria justificar sua existência continuada
se tornasse independentes as pessoas dependentes e fizesse as pessoas mancas andar com seus
próprios pés. A suposição tácita, raras vezes enunciada, é que as pessoas não-independentes,
pessoas que não participam do jogo de comprar e vender, não têm lugar na sociedade de
jogadores. “Dependência” tornou-se um palavrão: refere-se a algo de que as pessoas decentes
deveriam se envergonhar.
Quando Deus perguntou a Caim onde estava Abel, Caim replicou, zangado, com outra
pergunta: “Sou por acaso o guardião do meu irmão?” O maior filósofo ético do nosso século,
Emmanuel Levinas, comentou que dessa pergunta zangada de Caim começou toda a
imoralidade. É claro que sou o guardião do meu irmão; e sou e permaneço uma pessoa moral
enquanto não pergunto por uma razão especial para sê-lo. Quer eu admita, quer, não, sou o
guardião do meu irmão porque o bem-estar do meu irmão depende do que eu faço ou do
que me abstenho de fazer. E sou uma pessoa moral porque reconheço essa dependência e aceito
a responsabilidade que ela implica. No momento em que questiono essa dependência, e peço,
como fez Caim, que me dêem razões para que eu me preocupe, renuncio à minha
responsabilidade e deixo de ser um ser moral. A dependência de meu irmão é o que me faz um
ser ético. A dependência e a ética estão juntas, e juntas elas caem.
Pensando bem, o abrupto veredicto de Levinas não é novidade. Simplesmente reitera, em
termos de algum modo diferentes, o que foi, por milênios, o núcleo dos ensinamentos judaicocristãos, nutrindo e fazendo avançar nossa compreensão comum da humanidade e do ser
civilizado. O que Levinas disse transformou a necessidade do outro, assim como a
responsabilidade de satisfazer essa necessidade, na pedra fundamental da moralidade – e a
aceitação dessa responsabilidade se tornou o ato de nascimento da pessoa moral. Mas se o
veredicto de Levinas não é novidade, então o escárnio e o desprezo pela dependência e o
estigma associados a ela são; talvez até a mais profunda e radical das novidades com que
a civilização judaico-cristã já se confrontou em sua longa história. Vale a pena pensar um
pouco sobre essa novidade e suas causas, pois hoje, 100 anos depois, celebramos o aniversário
da ousada iniciativa que vem sendo pressionada a se desculpar por seus resultados.
Se a pergunta de Caim é feita hoje, em várias formas renovadas, por toda a Europa, e se o
Estado de bem-estar social está sob ataque de todos os lados, é porque desmoronou a
combinação única de fatores que levaram ao seu estabelecimento e o fizeram se parecer e
sentir como o Estado natural da sociedade moderna. Podemos dizer que, em seu nascimento,
o Estado de bem-estar social era “sobredeterminado”. Hoje, porém, o ressentimento em
relação às instituições dele e o gradual desmantelamento destas é que são “sobredeterminados”.
[...]
BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vida contadas e histórias vividas. São
Paulo: Zahar, 2008.
1. Faça uma Dissertação com mínimo de 1000 palavras;
2. Texto que trate de maneira clara e objetiva o solicitado;
3. Demonstração de leitura dos textos indicados;
4. Apresentação de citação direta comentada.
5. Bibliografia dos textos indicados
Lista de comentários
Resposta:
Diversidade e Lutas Identitárias: Um Olhar Histórico
Diversidade é uma característica intrínseca da humanidade, onde cada indivíduo é único e carrega consigo uma série de características que o diferenciam dos demais. Tal pluralidade é essencial para o enriquecimento da sociedade, pois traz diferentes perspectivas, experiências e culturas para o convívio coletivo. No entanto, ao longo da história, vimos que nem sempre a diversidade foi valorizada e respeitada, gerando lutas identitárias por parte de grupos marginalizados.
É possível observar essas lutas ao analisarmos o contexto histórico. Diversos momentos evidenciaram a necessidade de se lutar por igualdade e reconhecimento. Um exemplo marcante é o movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos, liderado por Martin Luther King Jr., na década de 1960. Tal luta buscava a igualdade e o fim da segregação racial, chamando a sociedade a refletir sobre questões raciais e promovendo mudanças significativas na legislação e na mentalidade da época.
Outro movimento importante é o feminismo, que surgiu no século XIX e continua presente até os dias atuais. A luta das mulheres por igualdade de direitos políticos, sociais e econômicos possibilitou conquistas significativas, como o direito ao voto e a conscientização sobre a desigualdade de gênero.
Recentemente, também observamos a ascensão de movimentos em prol dos direitos LGBT+. A busca por igualdade e aceitação de diferentes orientações sexuais e identidades de gênero têm se tornado cada vez mais relevantes. Esses movimentos são fundamentais para questionar e desconstruir estereótipos, preconceitos e promover uma sociedade mais inclusiva.
No entanto, é válido salientar que, apesar dos avanços e conquistas alcançados, a diversidade ainda é alvo de desigualdades e discriminações enraizadas em nossa sociedade. Surge, então, o debate em torno do Estado de bem-estar social e seu papel frente a essas questões. O serviço social, que tem como função principal cuidar e assistir as camadas mais desfavorecidas, muitas vezes enfrenta críticas de fornecer apenas assistência imediata, em vez de ajudar a promover a independência dessas pessoas.
Surge, então, a pergunta: a sociedade de hoje está pronta para aceitar a dependência e reconhecer a responsabilidade mútua entre seus integrantes? O filósofo Emmanuel Levinas ressalta que a dependência do outro é o que nos faz seres éticos, sendo nossa responsabilidade aceitar e atuar em prol do bem-estar de nosso próximo.
No entanto, é notório que a dependência tem sido estigmatizada e associada a uma falta de autonomia e produtividade. O desafio está em reconstruir essa visão, compreendendo que a interdependência é uma característica natural das relações humanas, e que é dever de cada indivíduo estar comprometido com o cuidado e a assistência ao próximo.
O Estado de bem-estar social, por sua vez, passa por transformações em sua estrutura conforme as sociedades demandam uma maior valorização e promoção da diversidade. O ressentimento em relação às instituições do Estado de bem-estar social e a tendência de desmantelamento evidenciam a complexidade dessas mudanças.
Em suma, a diversidade e as lutas identitárias são intrinsecamente conectadas à história da humanidade. É necessário refletir sobre a importância de valorizar e respeitar a diversidade, buscando a construção de uma sociedade mais igualitária e inclusiva. Para isso, é indispensável o reconhecimento da interdependência entre os indivíduos, compreendendo que a dependência não deve ser estigmatizada, mas sim encarada como parte fundamental do contexto humano. Somente através de uma conscientização coletiva é possível promover a igualdade e a justiça social.
Citação direta comentada:
"É claro que sou o guardião do meu irmão; e sou e permaneço uma pessoa moral enquanto não pergunto por uma razão especial para sê-lo." (Bauman)
Esta citação de Bauman destaca a responsabilidade moral que cada indivíduo tem em relação ao cuidado e bem-estar do próximo. Ela ressalta a importância de reconhecermos nossa interdependência e aceitarmos a responsabilidade que isso implica, sem questionar ou justificar essa necessidade de cuidado. Ser o guardião do nosso irmão implica em assumir a responsabilidade moral de zelar pelo bem-estar do outro e promover relações mais justas e igualitárias na sociedade. A dependência do outro é o que faz de nós seres éticos e nos instiga a aceitar essa responsabilidade.