Cenários sobre o Impacto da Privatização do Setor Elétrico nas Tarifas: O Caso da Escelsa

Revista Brasileira de Energia  Vol. 4  |  N o  2  Cenários sobre o Impacto da Privatização do  Setor Elétrico nas Tarifas: O Caso da Escelsa 

Cenário

Author Flávio Palma Rosa

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Revista Brasileira de Energia  Vol. 4  |  N o  2  Cenários sobre o Impacto da Privatização do  Setor Elétrico nas Tarifas: O Caso da Escelsa 

Cenários sobre o Impacto da Privatização  do Setor Elétrico nas Tarifas:  O Caso da Escelsa  Luiz Pinguelli Rosa *  e  Carlos Augusto Amaral Hoffman ** 

I. Introdução  A política do atual Governo aponta para a privatização, sob forma de venda de ativos do Estado  e  para  a  participação  privada  na  expansão  do  setor,  o  que  pode  se  dar  pela  venda  de  ações  das  empresas públicas, parcerias para conclusão de obras, estímulo à cogeração por indústrias para venda  de  excedente  à  rede.  A  Lei  de  Concessões  de  Serviços  Públicos,  a  Lei  8987  aprovada  em  13  de  fevereiro de 1995 segue esta linha.  Essa Lei permite a prorrogação das concessões atuais, tanto às de distribuição, cuja maior parte  está com as concessionárias estaduais (cujos acionistas majoritários são os Governos Estaduais), como  às  de  geração  e  transmissão,  com  preponderância  das  empresas  do  Grupo  ELETROBRÁS  (cujo  acionista majoritário é a União). Eram exceções as empresas distribuidoras federais ­ a LIGHT no Rio e  a ESCELSA, no Espírito Santo.  A Espírito Santo Centrais Elétricas S.A. ­ESCELSA foi privatizada, quatro dias após a aprovação  da Lei 9074(que regulamenta a Lei das Concessões e cria a figura do Produtor Independente), em leilão  realizado na  Bolsa de Valores do Rio de Janeiro e que foi questionado judicialmente, pois existem dúvidas no  meio jurídico sobre a constitucionalidade da Lei das Concessões (Ver item 4). Além dessas dúvidas, fica  evidente que o preço mínimo das ações, obtido na avaliação dos consultores, contratados pelo BNDES  ficou aquém do que poderia ser alcançado pela venda de um serviço, ainda, monopolizado.  O  trabalho  apresenta,  crucialmente,  informações  relevantes  sobre  a  ESCELSA  (Sec.  II);  sobre  sua  estrutura  de  custos  e  tarifas  (Sec.  III);  as  questões  legais  (Sec.  IV)  e,  finalmente,  os  cenários  de  evolução das tarifas (Sec. V e VI).  II. Estrutura da Escelsa e do Mercado  A  empresa  era,  até  1994,  uma  sociedade  anônima  de  capital  fechado,  controlada  pela  ELETROBRÁS,  com  72,337%o  das  ações  e  com  participação  do  Governo  Estadual  (23,176%),  as  Prefeituras (2,298%) e outros acionistas com os restantes 2,189%. No final de 1994 o Governo Estadual  vendeu sua participação que foi, na época, contestada judicialmente pelo movimento sindical.  Ao  Estado  do  Espírito  Santo  era  garantida  por  dispositivo  estatutário  a  indicação  de  um  dos  diretores e, caso sua participação atingisse 30%, de dois diretores. Assim, mesmo minoritário, o Governo  Estadual podia influir na estratégia da empresa.  A ESCELSA era estruturada em4 Diretorias e a Presidência, com um quadro funcional de 2674  empregados distribuídos da seguinte forma [Rodrigues et alli., 1995]: 



­ Distribuição 

­ 53,9% 

­ Operação 

­ 22,4% 

­ Suprimento 

­ 16,8% 

­ Finanças 

­ 4,1% 

­ Presidência 

­ 2,2% 

­ Cedidos 

­ 0,5% 

Diretor da COPPE/UFRJ e Presidente da ALAPE.  Doutorando da PPE/COPPE

** 



Revista Brasileira de Energia  Vol. 4  |  N o  2  Cenários sobre o Impacto da Privatização do  Setor Elétrico nas Tarifas: O Caso da Escelsa  A  empresa  atende  a  63  municípios  pertencentes  à  sua  área  de  concessão  ­  cerca  de  90%  do  território  estadual.  O  restante  é  atendido  pela  empresa  privada  Empresa  de  Luz  e  Força  Santa  Maria  S.A. ­ ELFSM ­ que atende seis municípios.  A concessão da ESCELSA foi estabelecida por decretos e portarias vencendo uma parte entre  1997  e  2005,  ou  prazo  indeterminado,  outra  parte.  A  empresa,  como  toda  concessionária,  está  sob  fiscalização do DNAEE, com os objetivos de:  ­ 

acompanhar a prestação dos serviços; 

­ 

zelar pela qualidade dos serviços; 

­ 

supervisionar a exploração dos recursos hídricos; 

­ 

autorizar os níveis tarifários propostos pela empresa. 

A ESCELSA faz parte do Sistema Interligado do Sul­Sudeste. coordenado pela ELETROBRÁS,  holding  das  empresas  elétricas  federais,  com  a  interveniência  de  órgãos  colegiados  onde  estão  representadas todas as empresas:  ­  Grupo  Coordenador  do  Planejamento  dos  Sistemas  Elétricos.  Criado  pela  Portaria  MME  n°  1617 de 23/11/82;  ­  Grupo  Coordenador  para  Operação  Interligada,  criado  pela  Lei  5899  de  05/07/73  (conhecida  como Lei de Itaipú) e regulamentadapeloDecreton°73102de07/11/73;  Em  1994  foi  aprovada  a  Lei  1009  que  instituiu  o  SINTREL,  pacto  operativo  com  as  linhas  de  transmissão  das  empresas  federais,  incluindo  a  ESCELSA,  e  aberto  à  adesão  das  estaduais  e  cuja  coordenação era da ELETROBRÁS. O objetivo era permitir, entre outras mudanças, o acesso à rede por  produtores  independentes,  ou  de  cogeradores,  bem  como  a  compra  de  energia  fora  da  empresa  concessionária da área, com pagamento de "wheeling" para o uso da rede. Como não houve adesão de  nenhuma  concessionária,  aproveitou­se  a  regulamentação  da  Lei  das  Concessões,  para  viabilizar  o  acesso  à  rede,  condicionando  a  prorrogação  das  concessões  à  liberação  de  alguns  consumidores  (atendidos em tensão superior à 69 kV e demanda contratada acima de 10 MW).  A  capacidade  instalada  da  ESCELSA  é  de  cerca  de  160  MW,  correspondendo  a  24%  das  necessidades do mercado. O restante é fornecido por FURNAS e ITAIPU­BINACIONAL.  As usinas da ESCELSA são hidráulicas, destacando­se Mascarenhas no Rio Doce com 123 MW  e Suíça no Rio Santa Maria com 30 MW. Estas duas usinas totalizam 96% da capacidade instalada total.  Pela  Lei  de  Itaipú,  de  1973,  a  aquisição  da  energia  daquela  Usina,  correspondente  às  quotas­  partes,  é  compulsória  para  as  principais  concessionárias  do  sistema  interligado  Sul­Sudeste.  Esta  aquisição  atinge  cerca  de  30%  da  energia  distribuída  pela  ESCELSA.  O  restante  advêm  da  geração  própria de FURNAS, e comporão o custo médio de suprimento da ESCELSA(Ver Sec. III).  A rede da ESCELSA compõe­se de 29,2 mil  Km de linhas nas tensões de 230, 138, 69 e 34,5  kV. O sistema se interliga ao Sul­Sudeste através de uma linha de 345 kV com o tronco de FURNAS e  de outra linha de 230 kV com a CEMIG.  O consumo de energia elétrica na área de concessão da ESCELSA foi de 4,362 TWh em 1993,  cerca  de  2%  do  consumo  nacional.  O  mercado  da  ESCELSA  constitui­se  de  614  mil  clientes  nas  diversas classes de consumo. A densidade de consumidores é de 15 por kmz . Para a comparação, a  densidade da LIGHT é de 236 por km 2 .  A estrutura do consumo, importante para a elaboração de cenários prospectivos é [Rodrigues et  alli, 1995]: ­ 

Setor industrial ­53,8% 

­ 

Setor residencial ­ 19,9% 

­ 

Setor comercial ­ 11,3% 

­ 

Setor rural ­ 4,2% 

­ 

Setor público.­ 2,5% 

­ 

Outros ­ 8,2%



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III.1 ­ Estrutura Tarifária  As tarifas foram desatualizadas pela chamada Lei Hélices Rezende(Lei 8631 ) aprovada no início  do Governo Itamar Franco, permitindo cada empresa definir sua estrutura e nível tarifário, embora sujeita  à  aprovação  do  DNAEE.  Com  a  política  econômica  de  contenção  da  inflação,  incluindo  as  tarifas  públicas, na prática esta lei foi revogada desde o Plano Real. Com a privatização da Escelsa ela poderá  ser evocada para mudanças de tarifa, já que essa é relativamente baixa no Brasil em geral.  A  prestação  do  serviço  de  energia  elétrica  tem  custos  bastante  diferenciados  em  função  da  sazonalidade (hidroelicidade relacionada ao regime pluviométrico), da tipicidade do consumidor (carga) e  do horário (ponta e fora de ponta) e da garantia do fornecimento (interruptível ou firme).  Uma  empresa  de  eletricidade  procura  ter  uma  estrutura  tarifária  que  leve  em  conta  custos  do  atendimento e tarifas cobradas ao consumidor final, permitindo subsídios cruzados para indústrias eletro­  intensivas,  consumidores  de  baixa  renda  e  áreas  rurais.  Em  teoria,  a  privatização  tende  a  reduzir  tais  subsídios,  pois  o  acionista  majoritário  buscará  a  maximização  do  seu  lucro  e  evitará  ao  máximo  que  atividades não­lucrativas tenham predominância com seu negócio.  A  tarifa  média  fornecimento  da  ESCELSA,  em  abril  de  94,  era  de  US$  54/MWh,  o  que  lhe  permitia operar os subsídios cruzados sem incorrer com prejuízo.  Destacam­se no faturamento da empresa os seguintes subgrupos tarifários:  ­ o subgrupo B1, para os consumidores residenciais;  ­  o  subgrupo  A2,  composto  de  grandes  consumidores  industriais  atendidos  em  alta  tensão;  ­ o subgrupo A4, para consumidores do setor público e de algumas empresas;  ­ o subgrupo B3, para o setor comercial e público;  ­ outros, incluindo o suprimento à EFLSM.  As  tarifas  industriais  (A2)  são  as  mais  baixas,  com  exceção  do  suprimento  para  a  Empresa  Santa Maria, como mostra a Figura 1 a seguir.  A  Lei  Eliseu  Rezende  de  1993  (n°.8631)  estabeleceu  obrigatoriedade  de  contratos  de  fornecimento entre a geradora (FURNAS) e a ESCELSA, que fixa sua demanda de potência e de energia  a curto, médio e longo prazos. FURNAS calcula suas tarifas com base nestas previsões e no consumo  efetivo passado.  As  tarifas  de  suprimento  de  FURNAS  à  ESCELSA  no  período  1994­2003  foram  estabelecidas  por um contrato decenal em US$ 24.35/ MWh. A tarifa de Itaipú foi de US$ 38.43/MWh em 1993. Com  isto, e supondo que a energia própria gerada pela ESCELSA, corresponda à US$ 5/MWh, então o custo  médio da energia era de US$ 28.19/MWh. A tarifa de venda para a EFLSM era, naquela época, inferior  ao custo médio do suprimento.



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Fonte: [DIEESE, 1995]  A participação no faturamento dos subgrupos era (abril de 1994) é mostrado na Tabela 1.  Tabela 1 ­ Participação no Faturamento e no Consumo  SUBGRUPO 

FATURAMENTO 

CONSUMO 

B1  A2  A4  B3  A3  B2  B4  Fonte: [DIEESE, 1995] 

30,6%  27,6%  18,3%  13,1%  4,0%  4,0%  2,4% 

20,8%  44,5%  16,6%  7,5%  3,8%  4,2%  2,6% 

Como se pode verificar há um nítido cruzamento entre os grupos B1(residencial) e A2(industrial)  quanto às participações no faturamento e no consumo que, em parte, pode ser justificado pela diferença  entre os custos marginais do atendimento a cada um deles. 

III.2 ­ Desempenho Econômico Financeiro e Técnico  A  empresa  não  escapou  da  crise  do  setor  elétrico  com  tarifas  historicamente  comprimidas,  evidenciado  pela  rentabilidade  do  patrimônio  líquido,  medida  pela  relação  entre  o  lucro  líquido  e  o  patrimônio  líquido  que  reduziu­se  entre  1989  e  1992,  tornando­se  negativo  a  partir  de  1991.0utro  indicador que demonstra a crise é o da taxa de remuneração do investimento, definida segundo o critério  de "custo de serviço" e que não atingiu nestes anos o mínimo legal de 10% ,sendo até, em alguns anos,  negativa.  A  partir  de  1993  a  recuperação  tarifária  e  o  cancelamento  das  dívidas  intra­setoriais  (CRC)  diminuíram o grau de endividamento, que passou de  53% em 1989  para 29% nesse ano, repercutindo  positivamente na liquidez da empresa, que melhorou.



Revista Brasileira de Energia  Vol. 4  |  N o  2  Cenários sobre o Impacto da Privatização do  Setor Elétrico nas Tarifas: O Caso da Escelsa  Alguns aspectos dos indicadores de despesas mostram a melhoria do desempenho da empresa.  O item compra de energia apresentou redução, com. os contratos com FURNAS, passando de 54,79%  da  receita  operacional  em  1993  contra  61,08%  em  1992.  Isto  deve­se,  fundamentalmente,  a  que  o  aumento  de tarifa  de fornecimento foi  superior  ao  de tarifa  de  suprimento (contatos  com FURNAS).  As  despesas com pessoal permaneceu na média histórica dos últimos 5 anos, em torno de 27 %.  A  tarifa  média  após  atingir  um  patamar  irrisório  de  US$  26/MWh  recuperou­se  em  1990  para  US$  50/MWh,  caindo  em  1991  para  US$  42/Mwh  e  subindo  em  1993  para  cerca  de  US$54/MWh,  ficando  neste  patamar  ao  longo  do  Plano  Real.  Para  esse  quadro  contribuiu  o  aumento  da  tarifa  residencial que no período 1986­1993 variou, em termos reais, de 130%.  Quanto  ao  desempenho  técnico,  que  reflete  necessidades  de  investimento  na  distribuição,  destacam­se as perdas (tanto as técnicas quanto as comerciais) que subiram a uma taxa média anual de  9,8% entre 1988 e 1993, atingindo neste ano 11,4% da energia requerida, ou seja, cerca de 500 GWh ou  US$  27  milhões.  Estas  perdas  não  se  explicam  apenas  por  problemas  técnicos,  mas  também  por  desvios, ligações clandestinas e adulterações ou mesmo inexistência de medidores.  A  deterioração  do  desempenho  operativo  da  ESCELSA  pode  ser  observado  pela  queda  nos  índices  de  continuidade  dos  serviços  de  energia  elétrica,  acompanhados  pelo  DNAEE  e  que  medem  a  qualidade do serviço prestado pelas concessionárias e que são:  DEC ­ duração equivalente por consumidor  FEC ­ freqüência equivalente por consumidor  O DEC mede o número médio de horas sem energia por consumidor e foi 24,31 horas em 1991,  acimado  limite  permitido  de  22horas  e  muito  acima  da  média  da  região  Sudeste,  de  20  horas.0  FEC  mede o número médio de interrupções por consumidor e foi de 17,08 em 1991,.acima do limite aceitável  de 12,6 e da média da região Sudeste que foi de 12 interrupções por consumidor[Rodrigues et alli, 1995]:  IV ­ A Privatização da Escelsa 

IV.1 ­ O Processo de Venda  No  Leilão  de  Privatização  da  ESCELSA,  empresa  elétrica  federal  do  Espírito  Santo,  foram  arrecadados  em  dinheiro  R$  220  milhões.  De  fato,  o  valor  da  empresa,  avaliado  pelos  consórcios,  contratados pelo BNDES, por meio do fluxo de caixa descontado, era cerca de R$ 600 milhões. Para a  transferência do controle acionário bastava a venda de mais de 50% das ações que foram compradas no  leilão por R$ 338 milhões, sendo R$ I 18 milhões pagos em papéis (moeda podre) [Rosa, 1995].  Mas a empresa tinha em caixa R$70 milhões e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento  Econômico  e  Social)  vai  "securitizar"  para  ela  R$  198  milhões  nas  contas  de  resultados  a  compensar(CRC). FURNAS tem um saldo de R$ 600 milhões de crédito em CRC e não pode usá­la, ao  contrário da ESCELSA privada. Além disso, foi feita compra antecipada de energia de FURNAS para a  ESCELSA, de R$ 36 milhões. Os novos controladores da ESCELSA passaram a dispor de cerca de R$  300 milhões.  A empresa vem aumentando sua receita acentuadamente e tem havido aumento da tarifa média,  colocando  em  dúvida  a  projeção  do  fluxo  de  caixa  feita  pelos  dois  consórcios,  um  deles  liderado  por  Deloitte  Touche  Tohmatsu  Consultores  S.C.  e  outro  liderado  pela  TREVISAN.  Ademais,  do  edital  do  leilão  proibia  os  serviços  conexos  à  energia  elétrica, mas  um  segundo  edital incluiu telecomunicações,  sem ser reavaliado o fluxo de caixa. Dessa forma, a receita crescerá com o simples aluguel das torres ou  do uso da rede instalada para passagem de cabos de telecomunicações, inclusive de fibras óticas. 

IV.2 ­ A Questão da Legalidade da Forma de Privatização  O  Artigo  175  da  Constituição  determina  que  a  transferência  de  concessão  deve  ser  feita  pela  União  por  meio  de  licitação.  A  Lei  8666  estabelece  as  modalidades  de  licitação.  O  leilão  é  restrito  à  venda de bens inservíveis ao Estado. Uma concessão é uma responsabilidade que a União delega. Não  é  o  caso  de  uma  siderúrgica  ou  outra  fábrica.  Pode faltar  o  produto  ou  a fábrica  ser  fechada  após  ser  privatizada,  como  fez  uma  empresa  no  Nordeste.  Mas,  se  faltar  luz,  as  cidades  ficam  às  escuras,  os  hospitais param, indústrias não produzem.  Por  isso,  a  licitação  de  serviço  público  tem  de  ser  feita  por  concorrência  pública.  A  Lei  de  Concessões,  estabelece  as  exigências  que  o  edital  de  concorrência  deve  fazer  para  qualificados  concorrentes. Nada foi feito sob alegação de que se leiloou o controle da empresa apenas. Em seguida,  o  Governo  outorgou  a  concessão  à  empresa  privatizada  sem  nenhuma  licitação.  A  nova  Lei  de



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IV.3 ­ Os Efeitos Imediatos e a Questão da Concessão  Se o objetivo é arrecadar recursos para abater a dívida do Governo para controle da inflação, o  BNDES foi incompetente, pois foram arrecadados R$ 220 milhões na venda e deixados R$ 300 milhões  em favor da empresa, como foi visto na Seção IV.l.  Se o objetivo é baixar tarifas, não é real: a Companhia Elétrica de Mato Grosso compra energia  da  Usina  de  Juba,  do  grupo  privado  Itamarati,  por  mais  de  US$  40/MWh,  enquanto  Furnas,  estatal,  a  fornece por cerca de US$ 25/MWh.  Se  o  objetivo  é  expandir  a  oferta,  a  participação  privada  deveria  ser  em  obras,  cogeração,  produção independente e conservação de energia.  Se o objetivo é puramente passar empresas elétricas para a gestão privada, então que o BNDES  aja com competência para que a venda obedeça os princípios éticos e legais do serviço público.  Os  novos  controladores  têm  com  o  Poder  Concedente,  a  União  representada  pelo  DNAEE  um  Contrato de Concessão, definindo todos os deveres e direitos da Concessionária e os deveres e direitos  de  seus  consumidores.  Esse  contrato  está  previsto  na  Lei  das  Concessões.  O  Contrato  de  Concessão  001/95,reproduz  "ipsis  literis"  a  Lei  das  Concessões,  ficando  vago  e  impreciso  o  que  se  entende  por  "qualidade, regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, modicidade das  tarifas e cortesia na prestação dos serviços aos usuários" (Ver Cláusula Quarta ­ Das Condiçoes Gerais  de Fornecimento).  Um dos pontos obscuros do Contrato é o que estanciece a duração do mesmo. Pela Lei o prazo  máximo  de  uma  concessão  é  de  trinta  mais  uma  prorrogação  de  vinte  anos.  No  contrato  tem  os  já  citados 30 anos, mas na Cláusula Segunda prevê prorrogação, sem definir o novo prazo.  Outro  ponto  é  o  referente  ao  acesso  à  rede  de  transmissão.  Como já  citado,  o  SINTREL  é  um  pacto  operativo  entre  as  empresas  do  Grupo  ELETROBRAS  que,  na  época  de  sua  criação,  incluía  a  ESCELSA.  O  Contrato  de  Concessão,  em  sua  cláusula  Quinta  ­  Obrigações  da  Concessionária  estabelece na letra m que essa deve "aderir ao Sistema Nacional de Transmissão de Energia Elétrica­  SINTREL".  V ­ Cenários da Evolução das Tarifas com a Privatização  

V.1 ­ Comparação Internacional  Em  primeiro  lugar,  deve  ser  observado  que  a  tendência  predominante,  nos  países  em  que  ocorreu a privatização do setor elétrico, tem sido 0 aumento generalizado das tarifas. Segundo dados da  OLADE  [1991],  no  início  de  1991  os  níveis  tarifários  na  Argentina  e  Chile,  após  privatizarem  o  setor  elétrico, comparativamente ao Brasil eram os mostrados na Tabela 2.  Tabela 2 ­ Tarifas Elétricas US$ / MWh­1991  Residencial 

Comercial 

Industrial 

Argentina 

94,3 

106,2 

63,1 

Chile 

111,1 

102,3 

63,2 

Brasil  51,3  Fonte: OLADE [1991] 

57,1 

29,2 

Outros dados, apresentados no CIER em 1994 [Edison R. Matthey, 1994] para o Chile, que é o  caso melhor, são mostrados na Tabela 3.



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Tabela 3 ­ Tarifas no Chile US$ / MWh  US$/MWh 

Residencial 

Pequenas  Indústrias 

Grandes  Indústrias 

96,3 

86,2 

54,5 

Abril­93  81,5  Fonte: MATHOY [1994] 

81,5 

51,6 

Abril­91 

Apesar de pequena queda observada, as tarifas ainda são muito mais elevadas do que no Brasil.  O Regulatory Polycy Institute de Oxford concluiu que na Inglaterra a energia elétrica era em 1991  25%  mais  cara  para  o  setor  residencial  e  18%  mais  cara  para  o  industrial  do  que  seria  sem  a  privatização [Gordon MacKerron, 1994].  Estes sistemas privatizados têm forte componente de geração termelétrica, o que é diferente do  caso  brasileiro  onde  hoje  mais  de  90%  da  geração  ë  hidrelétrica.  Entretanto,  há  tendência  à  termeletrificação da expansão, apesar de haver cerca de 12 GW de obras, a maioria de hidrelétricas, a  serem  completadas.  As  termelétricas  poderão  ter  um  papel  relevante  localmente  em  alguns  estados,  como o Espírito Santo. 

V.2 ­ A Construção dos Cenários  Segundo relatório do Banco Mundial [ 1990] o custo marginal no Brasil, pelo qual ele recomenda  atribuir o preço da energia, era:  Industrial 

Residencial 

AI 

Bl 

44,75  US$/MWh  A2 

48,40 

A3 

50,90 

A4 

63,99 

98,95 

Tomando como base este valor, hipoteticamente, a tarifa A2 praticada pela ESCELSA subiria de  cerca de 33.3 US$/MWh para 48.40 US$/MWh, o que implicaria um aumento de 45,3%. O valor atual é  cerca de 64% do chileno em grandes indústrias (alta voltagem) em abril de 1993 (51.6US$/MWh).  Na direção do aumento da tarifa com a privatização contribuem:  a) aumento da remuneração do capital do investidor;  b) necessidade de investimento na distribuição que está se deteriorando;  c) possível aumento da tarifa de geração e transmissão, que afeta a energia comprada  pela ESCELSA, e tendência de tarifas próximas no Mercosul.;  d)  possíveis  alternativas  de  geração  termelétrica  no  Espírito  Santo,  usando  carvão  trazido no retorno dos navios da Vale do Rio Doce.  Em direção oposta podem atuar:  a')  redução  dos  custos  operacionais  pelo  aumento  da  eficiência  técnica  e  redução  de  perdas;  b') aumento da produtividade e redução do pessoal;  c') contratos assinados com FURNAS até 2003;  d') pré­compra de energia de Itaipú acertada pela ESCELSA, antes da privatização.  O  item  a  dependerá  do  valor  de  venda  da  empresa  na  privatização,  ainda  indefinido.  Mas  a  remuneração  do  capital  privado  deverá  estar  entre  15%  e  20%  ao  ano,  enquanto  o  do  setor  público  é  legalmente 10% e na prática tem sido negativa ou muito baixa.  O  irem  d  depende  muito  da  eficiência  da  termelétrica,  que  pode  ser  de  cerca  de  50%  se  usar  ciclo combinado a gás, mas é de 30 a 40% com turbinas a vapor e carvão sem a gaseificação deste. O



Revista Brasileira de Energia  Vol. 4  |  N o  2  Cenários sobre o Impacto da Privatização do  Setor Elétrico nas Tarifas: O Caso da Escelsa  preço  do  carvão  é  geralmente  sensível  ao  preço  internacional  do  petróleo  que  tende  a  aumentar  no  longo  prazo.  Relatório  do  Conselho  Mundial  de  Energia  aponta24  US$/  barril  a médio  prazo, mas  este  valor  pode  aumentar  com  as  taxações  de  emissãodeC02emdiscussãonaConvençãodoClimanaONUeporfatores políticos imponderáveis.  Com base nestes dados são conjecturados os seguintes cenários de tarifas:  Alta ­ predomínio dos pontos (a), (b), (c), (d)  Baixa­ predomínio dos pontos(a'),(b'),(c'),(d')  Média­ compensação entre (a), (b), (c), (d) e (a'), (b'), (c' ), (d' ) ou entre alguns deles.  Tarifa Média Geral  (US$ / MWh)  PRAZO 

MÉDIO 

Alto 

70 

Médio 

65 

Baixo 

60 

Tarifa Industrial(A2)  (US$ / MWh)  PRAZO 

MÉDIO 

Alto 

48 

Médio 

43 

Baixo 

38 

Arbitrou­se  aqui  como médio  prazo  o  de  2  a  5  anos,  o  que  poderia  ser  considerado  curto  face  aos prazos típicos do setor elétrico.  VI. Análise dos Resultados e Conclusões  Os cenários apontam um sensível aumento de tarifas.  Estes  valores  são  conjecturas  para  o  médio  prazo  para  discussão  e  aprofundamento  com  a  obtenção  demais  dados.  A  curto  prazo,  por  razões  políticas,  não  se  espera  que  o  DNAEE  autorize  aumentos de tarifas substanciais.  O trabalho do Banco Mundial usado como referência para cálculo preliminar é anterior à Lei de  Concessões.  Esta  Lei  alterou  significativamente  a  concepção  de  mercado  de  energia  elétrica  com  a  criação do mercado concorrencial, constituído por aqueles consumidores atendidos em tensão superior à  69  KV  e  com  demanda  contratada  superior  a  10  MW.  Estes  poderão  comprar  sua  energia  de  outras  concessionárias, via o sistema de wheeling do SINTREL, ou de produtores independentes.  Pode­se considerar que  esta parcela seja responsável pela quase totalidade dos consumidores  atendidos  em  A2  pela  Escelsa.  Para  simplificar  o  exercício,  supõe­se  que  o  mercado  concorrencial  alcance40% do mercado da ESCELSA. Ora, o contrato de concessão estabelece que o concessionário  poderá  majorar  (ou  diminuir)  suas  tarifas  caso  ocorra  uma variação  de mercado  que  altere  a  condição  inicial  de  equilíbrio  econômico­financeiro  do  Contrato  de  Concessão  (Ver  Sub­Cláusula  Primeira  da  Cláusula Nona ­ Tarifas de Energia Elétrica). Este será o caso da introdução do mercado concorrencial,  pois  haverá  uma  perda  potencial  de  receita  da  ordem  de  25%.  Essa  diferença  hipotética  terá  de  ser  cobrada dos denominados consumidores cativos. Dessa forma, deve­se esperar reajustes maiores nas  tarifas  para  consumidores  residenciais,  comerciais  e  pequenas  indústrias,  que  não  estão  no  mercado  concorrencial.  Os  impactos  do  mercado  concorrencial  somente  se  dará  emprazo  maior,  embora  o  cenário  de  elevação  das  tarifas  para  os  consumidores  cativos  poderá  ocorrer  antes,  na  medida  em  que  o



Revista Brasileira de Energia  Vol. 4  |  N o  2  Cenários sobre o Impacto da Privatização do  Setor Elétrico nas Tarifas: O Caso da Escelsa  desempenho da categoria industrial na ESCELSA está intimamente ligado aos preços internacionais das  commodities produzida pela indústria, como os pellets de minério de ferro. Se houver uma repetição do  ocorrido em 1993, quando caiu o preço desses produtos, acarretando queda do mercado da ES CELSA,  haverá o processo perverso de aumento da tarifa residencial e das pequenas empresas.



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BAETA, Herman; Ação em nome do Presidente do Clube de Engenharia, Raymundo de Oliveira e de  L.P. Rosa, 1995.

·

BANCO MUNDIAL, Relatório ao Governo Brasileiro sobre Energia; 1990.

·

MACKERRON, Gordon; Sussex University Paper, 1994. MATHEY, Edison; CIER, 1994.

·

OLADE, Relatório, 1991.

·

Processo  de  Privatização  do  Setor  Elétrico  Brasileiro.  O  Caso  da  Escelsa  Estudos  Setoriais  DIEESE,n°4, 1995.

·

ROSA, L.P.; Folha de São Paulo, maio de 1995.

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