ÁREA DE INTERESSE: 2 – Economia Regional e Baiana: aglomerações produtivas. A indústria de celulose como transformadora das relações no campo: reflexões sobre o complexo agroindustrial do Extremo Sul da Bahia Rivanna Maria Figueredo de Matos Graduanda em Economia pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) Email:
[email protected] Endereço: Rua Santo André, Bairro Nossa Senhora da Conceição, n°413. Itabuna BA Telefone: (73)991594157
RESUMO O presente artigo objetiva conhecer e refletir acerca do sistema agroindustrial de celulose e papel no Extremo Sul Baiano, inserido em um contexto histórico específico e decorrente do cenário político e econômico nacional. Destacase a referência econômica que a atividade possui para a região, observando as mudanças nas relações produtivas, decorrentes das transformações no uso da terra a partir da implantação da agroindústria, uma estrutura característica do modo de produção capitalista a partir do movimento de especialização produtiva. Assim, a análise do conjunto de fatores que contribuíram para as transformações socioeconômicas descritas e os seus resultados para a situação social da região, traz a eucaliptocultura e a produção de celulose e papel, como objetos de reflexão. Palavraschave: complexos agroindustriais; cultivo de eucalipto; produção de celulose e papel; uso da terra; modificações socioeconômicas.
ABSTRACT This article aims to meet and reflect on the agroindustrial pulp and paper system in the extreme south of Bahia, inserted in a specific historical context and from political and national economic environment. Economic reference it is noteworthy that the activity has for the region, observing changes in production relations, resulting from changes in land use from the implementation of agroindustry, characteristic structure of the capitalist mode of production from the productive specialization movement. In this way, the analysis of all the factors contributing to the socioeconomic changes described and their results to the social situation in the region, brings the eucalyptus and the production of pulp and paper as reflecting objects.
Keywords: agroindustrial complex; eucalyptus plantations; pulp and paper production; land use; socioeconomic changes. 1
CONSIDERAÇÕES INICIAIS As origens e a expansão do modo de produção capitalista em todas as suas fases, estão
diretamente associadas às mudanças nos sistemas agrário e agrícola de qualquer sociedade tomada como referência, seja ela um país, grandes ou pequenas regiões, caracterizando cadeias produtivas cada vez maiores e especializadas, principalmente a partir da industrialização do campo. No Brasil, apesar de tardias, as fases do capitalismo industrial e monopolista avançaram de forma bastante intensa, considerando todo o período colonial, em que predominava a produção de commodities baseada em ciclos direcionados à exportação (cana de açúcar, ouro, café), que eram concentrados nas propriedades latifundiárias em detrimento de poucos minifúndios dedicados à demanda interna. Segundo Prado Júnior (2000), a questão agrária sempre foi sinônimo de pobreza rural, como consequência dos padrões do passado colonial. Após o período colonial, e com o capitalismo industrial já em avanço na Europa e Estados Unidos, o Brasil passou por um processo de transição a partir da substituição de importações e a industrialização. No entanto, foram poucas as mudanças na dinâmica agrícola e nas políticas agrárias, em que continuaram predominando os latifúndios, com as relações produtivas baseadas na chamada agricultura patronal. Prado Júnior (2000) observa que essa dinâmica não possui caráter de eficiência de distribuição e alocação, ao contrário da agricultura familiar, que por sua vez produz de forma sustentável e com equidade. Entretanto, esta é desvalorizada pelas elites, que defendem a sua falta de importância econômica, uma forma de produzir ineficaz, limitada por não explorar a terra como normalmente ocorre na agricultura capitalista, de forma compulsória e especializada.
Assim, ao longo do século XX, as diversas mudanças que a economia brasileira vivenciou nos seus sistemas agrícola e industrial resultam na internacionalização econômica, no avanço da globalização e no surgimento de sistemas agroindustriais. Tais mudanças se deram em âmbito nacional, como resultado do cenário político e econômico, a partir das iniciativas provenientes das classes dominantes. O golpe de 1964, liderado por essas classes foi resultado do emergente interesse na questão agrária pelas classes populares, além da pressão para a realização de medidas ligadas à reforma das estruturas produtivas e relações de trabalho rural, marcando o inicio de uma nova perspectiva para a questão agrária: a realização de uma “reforma agrária”. Vale ressaltar a principal diferença entre ambos, que para muitos representa equivocadamente a causa e o efeito restritos a uma mesma situação. De acordo com Mendonça (2006), a questão agrária nos remete à uma noção mais abrangente e crônica, ligada a um longo processo de lutas sociais e tem forte influencia do modo de produção vigente. Já a reforma agrária traz uma designação mais recente, e tem relação com a realização de expectativas que teoricamente levariam a melhorias no sistema e ao crescimento econômico. No caso do Brasil, esta reforma resultou no surgimento de politicas agrícolas que visavam maximizar a capacidade produtiva e acelerar o processo de industrialização do campo. A análise a ser feita no presente artigo reside neste processo e a sua influência no surgimento e expansão das cadeias produtivas regionais, ou seja, a forma que como uma série de medidas tomadas em âmbito nacional levaram a profundas mudanças no sistema agrário e agrícola de uma determinada região. Nesse estudo, a região a ser analisada compreende o Extremo Sul da Bahia, que a partir da década de 70 passa por um intenso processo de transformação socioeconômica decorrentes das mudanças no uso da terra. A introdução da cultura do eucalipto na região protagoniza esse processo de transformação, que segundo Almeida (2009), foi resultado dos estímulos do Governo Federal ao cultivo de eucalipto, levando as primeiras empresas a se instalarem na região.
Hoje, o Extremo Sul da Bahia tem destaque mundial na produção de celulose e papel, tendo notável participação no PIB do estado. O foco da parente discussão reside na importância
verificada na dinâmica do uso da terra, que resultou em modificações
socioeconômicas, tais como as variações na dinâmica fundiária, a configuração populacional da região, a distribuição de renda e os níveis de emprego. O primeiro ponto tratado será um panorama histórico das políticas agrícolas no Brasil dos últimos 50 anos, além de alguns aspectos relacionados à questão fundiária, fazendo um breve retrato desse cenário dentro da lógica do sistema capitalista, que servirão de base para compreender o contexto das transformações aqui tratadas. O segundo tópico iniciará a descrição das transformações em âmbito regional, vistas a partir da implantação do complexo florestaindústria no extremo sul baiano. Por fim, a análise chega ao uso da terra, dada a introdução do cultivo do eucalipto. Dessa maneira, as duas perspectivas permitem avaliar os aspectos sociais e as transformações fundiárias ocorridas após a entrada da agroindústria de celulose na região. O presente estudo objetiva, portanto, conhecer e refletir sobre a agroindústria de celulose e papel, como transformadoras das relações produtivas na região e as suas relações com a política agrícola nacional vigente, com base nos principais aspectos referentes à evolução do uso da terra no extremo sul baiano nos últimos trinta anos assim como os seus reflexos na situação socioeconômica da região. 2
MATERIAIS E MÉTODOS Na determinação da área de estudo, considerase o setor agroindustrial como
transformador das relações produtivas, que anteriormente baseadas na agropecuária, sofreram modificações a partir do cultivo de eucalipto integrado às indústrias de celulose (Veracel, Aracruz e Suzano) implantadas na região. A área geográfica abrange todo o Extremo Sul da Bahia, e inclui os municípios de Alcobaça, Belmonte, Caravelas, Eunápolis, Guaratinga, Ibirapuã, Itabela, Itagimirim, Itapebi,
Itamaraju, Itanhém, Jucuruçu, Lajedão, Medeiros Neto, Mucuri, Nova Viçosa, Porto Seguro, Prado, Santa Cruz de Cabrália, Teixeira de Freitas e Vereda. Apesar de cada município ter uma situação econômica e social distinta, a presente discussão parte da análise do conjunto, evidenciando os aspectos transformadores de mais destaque verificados em toda a região. Os procedimentos utilizados se enquadram no método histórico comparativo, por se tratar do estudo de um processo de modificações na dinâmica produtiva da região. Além disso, o tema está inserido dentro de um contexto social, político e econômico, com uma evolução histórica a ser analisada a partir de uma perspectiva mais abrangente. Sob uma base de pesquisa descritiva, o método histórico foi direcionado ao estudo do material bibliográfico disponível para a construção do corpo teórico do tema, tais como livros, ensaios e dissertações, além de dados secundários disponibilizados pela Associação Brasileira de Celulose e Papel (BRACELPA) e pela Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI –BA). A partir de um estudo sobre a questão agrária e agrícola, além de aspectos sociais dentro das relações produtivas no modo de produção capitalista, foi desenvolvida a contextualização histórica da implantação da cultura do eucalipto na região frente à situação verificada no âmbito sociopolítico nacional, que serve de base para determinar o foco da discussão, os objetivos e os elementos geográficos considerados. 3
PANORAMA HISTÓRICO E QUESTÃO FUNDIÁRIA A formação econômica do Brasil a partir de meados do século XX é caracterizada por
um acelerado processo de industrialização, resultantes das políticas econômicas. Da Era Vargas nos anos 30, por meio de um modelo de desenvolvimento de caráter popular e nacionalista, sugiram as primeiras políticas de industrialização, que comparadas aos demais países foram iniciadas tardiamente. Nas décadas seguintes, o processo se seguiu com cada vez mais intensidade segundo o perfil de cada governo, extinguindo as forças semifeudais que dominavam o país desde os tempos de colônia (BRESSER PEREIRA, 2003). Mesmo tendo passado por diversas crises ao longo do período, e ter o subdesenvolvimento e a má distribuição de renda como uma característica recorrente até os
dias atuais, o Brasil ganhou destaque no crescimento econômico após a substituição de importações, e o setor industrial passou a ocupar grande parcela do produto interno. A partir dessa perspectiva surge a necessidade de se analisar a indústria no Brasil como agente transformadora das relações no campo, ocorrendo no Brasil, assim como nos demais países capitalistas, sob uma constante luta de classes. Segundo BresserPereira (2003), a estrutura social antes do inicio da chamada Revolução Nacional Brasileira na década de 30, era composta de uma oligarquia aristocrática e grandes produtores rurais, tendo sua reprodução social baseada no latifúndio destinado à exportação e na agricultura de subsistência. Após a revolução, com a ampliação do mercado interno e da indústria, é percebido o surgimento de uma nova configuração agrícola, e a simples produção de matérias primas de base familiar dá lugar à expansão dos complexos agrícolas patronais. Para Graziano (1990), as diferenças entre questão a agrícola (o que, quanto e onde se produz) e questão agrária (a forma com que se produz) residem em modificações quantitativas, no que se refere ao aumento da produtividade, com grandes quantidades frente à diminuição dos preços dos bens produzidos, e mudanças qualitativas, relativas à maneira de se organizar o trabalho e a produção, interferindo assim no nível de renda e emprego dos trabalhadores rurais e a situação econômica das pessoas ocupadas no campo. Graziano ainda demonstra que essa dinâmica pode originar uma crise agrária a partir do momento que o avanço do setor agrícola, com a expansão da capacidade produtiva no fornecimento de matérias primas e alimentos leva à liberação da mão de obra para a indústria. Assim, chegase à ideia de industrialização do campo promovida pelo modo de produção capitalista, a partir da intensificação da produção pelo investimento em capital e tecnologia, que no Brasil, entre 1960 e 1970 trouxe a concentração das propriedades rurais, minimizando as pequenas unidades de produção e agravando os conflitos entre trabalhadores rurais, índios e grandes fazendeiros. Todos procuram entender o processo de desenvolvimento do modo capitalista de produção na sua etapa monopolista. Essa etapa apresenta traços típicos, como a presença de grandes complexos agroindustriais a integrar a produção agropecuária [...] e consequentemente redefine toda a estrutura socioeconômica e política no campo. (OLIVEIRA, 1990, p.5)
Nesta afirmação estão subentendidos os diversos aspectos ligados às mudanças no uso da terra perante a introdução de um sistema produtivo integrado. Para analisálos, devese entender o conceito e o funcinamento de um sistema agroindustrial. Segundo Alves Filho e Araújo (1999), um sistema agroindustrial é formado a partir de um acordo entre as indústrias e os produtores, em que a produção agropecuária é feita de forma especializada, passando a fazer parte de uma cadeia produtiva, com fortes investimentos em tecnologia e capital. Tal articulação permite que a indústria coordene todas as fases da produção, constituindo um agronegócio, segmento que cresceu a partir da fase concorrencial do capitalismo. Perante a implantação de um sistema agroindustrial, as questões agrária e agrícola anteriormente tratadas, considerando a agropecuária ligada ao comércio no modo de produção capitalista ganham um novo agravante, pois a partir do contrato firmado entre o produtor rural e a empresa, possibilitase a intervenção desta em todo o processo de produção. Assim, as mudanças no uso da terra vêm como as primeiras e mais importantes transformações verificadas na implantação de uma agroindústria. No contexto agrário, o trabalho rural toma uma nova estrutura, baseada no latifúndio, no lucro das empresas e no foco nas exportações. O que é cultivado no campo ganha o caráter de produto industrial, com a mecanização do processo produtivo e a transformação de trabalhadores rurais em assalariados, além do caráter restritivo da produção, voltada exclusivamente à atividade desenvolvida no complexo agroindustrial. No contexto agrícola, as mudanças também são visíveis, considerando que a produção passa a explorar as características geográficas (clima, relevo, etc.) e econômicas (baixo custo dos fatores de produção) e o produto em potencial a ser cultivado, além da introdução métodos que permitam uma maior produtividade como agrotóxicos, suplementos agrícolas e o investimento massivo em tecnologia, que caracterizam o processo de industrialização do campo.
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O CULTIVO DE EUCALIPTO E AGROINDÚSTRIA DE CELULOSE E PAPEL NO BRASIL Segundo dados divulgados pela Associação Brasileira de Celulose e Papel
(BRACELPA, 2003), a produção de celulose no Brasil teve inicio em meados da década de 70, a partir do cultivo das primeiras florestas de eucalipto com celulose de fibra curta, espécie que apresenta um maior rendimento a um menor tempo de rotação comparado se com as demais espécies cultivadas em outros países. Em 2012, o Brasil se tornou o 4° maior produtor no ranking mundial de celulose e 9° no de papel (BRACELPA, 2014) . Mais de um terço do que se produz é exportado, sendo que em um período de 7 anos entre o plantio das mudas e o corte, a produtividade das florestas chega a 44 metros cúbicos de por hectare ao ano. O processo de expansão da indústria de celulose e papel teve origem nas políticas públicas voltadas para a industrialização durante o governo de Ernesto Geisel, que junto ao BNDS (Banco Nacional de Desenvolvimento) elaborou o PND II (Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento). De acordo com Pinto (2004), o setor de celulose e papel estava entre as metas de produção dos setores tidos como prioritários, sendo indicado no plano a um aumento de aproximadamente 50% entre 1974 e 1979. Entretanto devese ressaltar que o setor foi eleito prioritário no plano pelo fato de a indústria de celulose e papel ter sido a pioneira na produção do papel à base de eucalipto de fibra curta. Assim, correspondia a um potencial da agroindústria a ser aperfeiçoado, pois desde os anos 50 vinha recebendo investimentos de empresas brasileiras, mas sua expansão era impossibilitada por conta dos elevados gastos em pesquisa e desenvolvimento para o plantio e manejo das espécies (PINTO, 2004). Dessa maneira, percebese que a função do PND II para o setor em período precedente foi possibilitar sua expansão por meio de incentivos fiscais, financiamentos e investimento em P&D, totalizando US$ 1,9 bilhões ao longo do governo Geisel. Tais investimentos permitiram o avanço das bases florestais e da produção para além da região sudeste, onde anteriormente o setor era concentrado, configurando uma transição entre os padrões de localização. Tal situação é apresentada por Santos (2012), que assim como em qualquer atividade desenvolvida no sistema capitalista resulta da busca por menores custos de produção,
ampliação da capacidade produtiva das indústrias e a possibilidade de incorporar grandes áreas destinadas ao plantio de eucalipto. 5
O EXTREMO SUL BAIANO
5.1 Evolução no uso da terra Refletir sobre o uso da terra no extremo sul baiano é o principal foco deste estudo, considerando o modo de produção vigente, além de fatores históricos, políticos e sociais que servem de alicerce para analisar a representatividade do agronegócio e da indústria de celulose e papel na economia da região. Para isso é necessário conhecer os antecedentes do processo, ou seja, descrever a evolução no uso da terra, para dar o respaldo necessário à análise. Ao longo da sua história, seguindo as influências da formação econômica do Brasil, a região Nordeste mais especificamente o estado da Bahia passou por diversos ciclos produtivos, que se iniciou no período colonial desde a extração de paubrasil e o cultivo de canadeaçúcar, até a fundação das vilas e a expansão da exploração de madeira, de pedras preciosas e a produção alimentos.
Segundo Guimarães (2009), No início do século XX, a construção de uma estrada de ferro entre Minas Gerais e a Bahia possibilitou o aumento populacional principalmente nas áreas rurais em que imigrantes estabeleceram uma diversificada agricultura de subsistência, baseada no trabalho familiar e com posse precária da terra. A região era relativamente isolada dos demais estados, não sendo atrativa a grandes investimentos em agronegócio até a segunda metade do século XX, quando a construção da BR101, representou a integração econômica do extremo Sul da Bahia com os demais estados e principalmente a região sudeste. Imediatamente após a sua construção, a BR101 levou ao acesso à Mata Atlântica remanescente na região e à exploração de madeiras nativas, agravando problemas sociais e ambientais. Com o passar dos anos cidades se estabeleceram à beira da estrada, e o extremo sul passou a desenvolver atividades ainda relacionadas ao trabalho familiar e que absorviam grande quantidade de mão de obra como a pecuária extensiva, além do cultivo de café,
pimenta do reino e a fruticultura comercial, com plantações de melancia, manga, coco, abacaxi, melão e mamão. Guimarães ainda destaca que a partir dos anos 60, novas características passaram a modificar drasticamente a região. Iniciouse um processo de reflorestamento por parte de empresas produtoras de carvão, atraídas pelo baixo custo dos meios de produção. Em 1970, políticas provenientes do PND II se tornaram um atrativo aos grandes proprietários rurais, dando inicio ao cultivo de Eucalipto e possibilitando a implantação do polo de celulose no extremo sul da Bahia. Dentre essas políticas, podemos destacar a criação de órgão de incentivo ao desenvolvimento tais como o Fundo de Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste (FIDENE), subdivisão da Superintendência de Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste de (SUDENE), que concedeu incentivos fiscais para modernização das empresas agrícolas e industriais e para a criação de novos empreendimentos florestais, além do Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste (PROTERRA), que destinou recursos para o financiamento de projetos direcionados à expansão da agroindústria e da agricultura. Assim, os estímulos do governo tiveram grande influência na construção de um novo contexto econômica e social no extremo sul baiano, que passa a ter nas florestas de eucalipto integradas à produção de celulose uma espécie de identidade regional, pelo fato dessa atividade se tornar cada vez mais especializada e passar a influenciar na cultura, no comércio e na geografia local. 5.2 O processo de implantação da agroindústria de celulose e papel na região A implantação da indústria de papel e celulose no Extremo Sul da Bahia é um dos resultados do processo de expansão desta a nível nacional, considerando os grandes investimentos feitos pelas empresas e pelo governo. De acordo com Guimarães (2009), o plantio das primeiras florestas na região se deu a partir do norte do Espirito Santo, que faz divisa com o Extremo Sul e já desenvolvia atividades no setor com a chegada da Aracruz Celulose S.A, empresa pertencente ao Grupo Votorantim e ao BNDES, em 1967. Com a sua expansão, chegou até a Bahia passando a atrair
outras empresas como a paulista Suzano Bahia Sul Celulose S.A que iniciou a produção de papel na região em 1993 e mais posteriormente a Veracel Celulose e Papel S.A, pertencente à sueco finlandesa STORAENSO. Essas empresas ocupam posição de destaque no ranking mundial das produtoras do setor, segundo dados da BRACELPA (2003) e a Bahia figura como o segundo estado no país com a maior área plantada de eucalipto, atrás apenas de São Paulo. Nesse cenário, percebese a formação do complexo florestaindústria, que como anteriormente descrito é o resultado de um acordo realizado verticalmente – o agronegócio, que no caso da celulose e do papel resulta essencialmente na agroindústria, com grandes investimentos em capital e tecnologias aplicadas no meio rural. Na região considerada, os municípios que se inserem nesse complexo são: Alcobaça, Caravelas, Nova Viçosa, Mucuri, Prado, Ibirapuã, Teixeira de Freitas, Vereda, Lajedão, Canavieiras, Belmonte, Eunápolis, Guaratinga, Itabela, Itagimirim, Itapebi, Mascote, Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália. Estes são vinculados à pelo menos uma empresa do setor, executando atividades que vão desde o plantio mecanizado de mudas à fabricação do papel. O complexo florestaindústria do qual esses municípios fazem parte não significa apenas mais uma atividade desenvolvida na região. Representa a construção de um novo perfil econômico, uma nova forma de reprodução social que passou a modificar toda a base produtiva dos municípios e o espaço urbano como um reflexo das transformações no campo. 6
UMA BREVE REFLEXÃO SOBRE AS TRANSFORMAÇÕES NO USO DA
TERRA Trinta anos após o processo de implantação do complexo floresta indústria de celulose e papel na região, é possível verificar a partir de dados grandes transformações relativas ao uso da terra, sendo que a mais importante, na presente discussão é a concentração fundiária, típicas dos sistemas agroindustriais. Com base nos trabalhos de Almeida (2009), as propriedades rurais cresceram em extensão, mas reduziram em número, caracterizando uma homogeneização e especialização produtiva. Além disso, algumas propriedades passaram a aliar a pecuária à silvicultura,
utilizando métodos de rotatividade de solos. Ainda hoje, algumas atividades ligadas à agricultura familiar e à pequenas propriedades são desenvolvidas, tais como a fruticultura, o cultivo de café a canadeaçúcar, e a pesca nas áreas litorâneas, mas que têm importância secundária na dinâmica produtiva local quando comparados à agroindústria de celulose. Apesar de a silvicultura estar presente em todos os municípios considerados, em cada um destes foram verificadas mudanças com diferentes magnitudes e em épocas específicas. Mas considerando a região de forma conjunta, podese perceber que a eucaliptocultura foi uma alternativa segura e rentável aos grandes proprietários rurais de tornar produtivas as terras desvalorizadas pela pecuária, que foram transformadas em pastagens e pela exploração da madeira nativa. Segura pela garantia de retorno e pela conveniência assegurada pelo agronegócio, e rentável pelo aumento da capacidade produtiva a partir de vultosos investimentos em P&D. Assim, a agroindústria no Extremo Sul da Bahia ganha promove a chamada “eucaliptização”, que segundo Neto e Silva (2008) não se relaciona com o total da área das florestas plantadas e sim com o fato de que o eucalipto passou a ser o padrão econômico para a região. Mudanças positivas também podem ser percebidas no processo tais como o aumento de indicadores relacionados ao crescimento econômico dos municípios, de acordo com a Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEIBA), tais como o Índice de 1
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Performance Econômica , Produto Interno Bruto e Per Capita . Além disso, as indústrias tem melhorado o foco nas questões de responsabilidade social e ambiental, engajando a produção de papel e celulose nos eixos de desenvolvimento sustentável. Entretanto, o campo é a área mais sensível às transformações ocasionadas pela eucaliptocultura, e o desgaste dos recursos naturais ainda configura um grande problema a ser solucionado.
Os trabalhadores rurais também não influenciados negativamente pelo
agronegócio, já que a mecanização da produção reduz drasticamente os postos de trabalho no campo e desvaloriza a agricultura familiar, estimulando o êxodo rural e problemas sociais decorrentes, tais como desemprego, déficit habitacional e carência de infraestrutura.
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Dados disponibilizados em 2013. Os índices referem-se ao período de 1999 a 2010.
A agroindústria de celulose restringe o mercado de trabalho e limita o surgimento de outras atividades na região, já que o investimento feito pelas empresas e pelo governo com uma proposta de crescimento econômico acaba resultando no processo de “especialização” descrito: Através do forte apelo capitalista da produção em série para o mercado, muitos lugares no mundo se especializaram para atender uma globalização questionada pela sua dinâmica desigual. Meios de transporte, de comunicação e aperfeiçoamento das malhas viárias são pensados para atender, principalmente a atuação das grandes empresas. (NETTO E SILVA, 2008, p.92)
A especialização na perspectiva do modo de produção capitalista também de insere nos mecanismos criados pelo próprio agronegócio, desde as barreiras à entrada da concorrência, a eficiência operacional e redução dos custos de transação, até a propriedade de bens de produção tais como as terras e florestas plantadas, o domínio técnico e logística. Santos (2012) caracteriza a agroindústria de celulose e papel como uma atividade intensiva em capital e com tendência à concentração, justificando as características da mesma ao fato de que em escala local, a proximidade entre a indústria e as matérias primas tem grande importância. 7
CONSIDERAÇÕES FINAIS Com base nas leituras sobre o tema e nas reflexões sobre a agroindústria de celulose e
papel no Extremo Sul Baiano, é possível concluir que o processo descrito ocorrido no âmbito regional é decorrente de uma série de mecanismos do cenário econômico nacional, que vão desde o perfil dos governos no período considerado até a própria evolução do modo de produção no país.
As modificações verificadas no uso da terra são um retrato do processo de expansão do sistema capitalista, que em qualquer sociedade ou momento histórico passa pelas fases de mercantilização, industrialização e monopolização. Estas fases aliadas à ampliação do mercado financeiro, a internacionalização e a especialização, dão o respaldo necessário à caracterização da agroindústria como uma tendência do atual modo de produção. Quanto às florestas de eucalipto, verificase a importância da biotecnologia como fator de acréscimo da capacidade produtiva, a sustentabilidade e a eco eficiência por meio da chamada produção limpa, como uma forma de diminuir o desperdício dos recursos naturas e aumentar os ganhos financeiros. Essa notoriedade também decorre da atual fase do sistema capitalista, que encontra no desgaste ambiental e na sustentabilidade a principal barreira à sua expansão. Na questão social, podese perceber que a agroindústria da região correspondeu apenas ao crescimento econômico, não representando uma melhora na qualidade de vida da população, que se tornou essencialmente urbana pela escassez de trabalho no campo e ainda carece por melhoras na infraestrutura e na oferta de trabalho. Portanto, ainda há um longo trajeto a ser percorrido quando
se trata de
desenvolvimento econômico na região, que necessita da implantação de ações que possibilitem uma forma de produção menos restritiva, com alternativas e oportunidades que promovam ganhos sociais qualitativos com o uso da terra. . Referências: ALMEIDA, T. M. Cultivo de eucalipto no extremo sul da Bahia: modificações no uso da terra e socioeconômicas. Dissertação (Mestrado).Universidade Estadual de Santa Cruz, 2009.
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