UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
AVALIAÇÃO DO ENFRENTAMENTO DA HOSPITALIZAÇÃO EM CRIANÇAS POR MEIO DE INSTRUMENTOS INFORMATIZADOS
ELISSA ORLANDI MORAES
Vitória, ES 2007
Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
M827
Moraes, Elissa Orlandi, 1981Avaliação do enfrentamento da hospitalização em crianças por meio de instrumentos informatizados / Elissa Orlandi Moraes. – 2007. 207 f. : il. Orientadora: Sônia Regina Fiorim Enumo. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Ciências Humanas e Naturais. 1. Crianças – Assistência hospitalar. 2. Testes psicológicos para crianças – Automação. I. Enumo, Sônia Regina Fiorim. II. Universidade Federal do Espírito Santo. Centro de Ciências Humanas e Naturais. III. Título. CDU: 159.9
1
ELISSA ORLANDI MORAES
AVALIAÇÃO DO ENFRENTAMENTO DA HOSPITALIZAÇÃO EM CRIANÇAS POR MEIO DE INSTRUMENTOS INFORMATIZADOS
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação
em
Psicologia
do
Centro
da
Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia, sob a orientação da Profª. Drª. Sônia Regina Fiorim Enumo.
UFES Vitória, ES, setembro de 2007.
2
AVALIAÇÃO DO ENFRENTAMENTO DA HOSPITALIZAÇÃO EM CRIANÇAS POR MEIO DE INSTRUMENTOS INFORMATIZADOS
ELISSA ORLANDI MORAES
Dissertação submetida ao programa de Pós-Graduação em psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia.
Aprovada em 05 de setembro de 2007, por:
3
Dedicatória
“Este trabalho é dedicado à todas as pessoas que trabalham para ajudar a promover
o
bem-estar
principalmente
aquelas
de que
crianças, estão
hospitalizadas e necessitam de apoio e carinho.”
4 Agradecimentos Agradeço, em primeiro lugar, a Deus pelo dom da vida e por me proporcionar que, nesta vida, eu possa ter contribuído, mesmo que com uma pequena parcela, para que a vida de crianças internadas possa ter uma melhor qualidade. Mas, sei que o trabalha continua; Agradeço a minha orientadora, a Professora Doutora Sônia Regina Fiorim Enumo, por aceitar a tarefa de trabalhar nessa empreitada, por compartilhar seu conhecimento e por seu exemplo de dedicação e amor ao trabalho cientifico. Certamente, sem seu conhecimento e sem seu carinho, nada disso seria possível; Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, principalmente a Professora Doutora Claudia Broetto Rossetti e o Professor Doutor Paulo Rogério Menandro, por suas valiosas contribuições no Exame de Qualificação; Agradeço a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior) pela bolsa recebida durante o percurso da pesquisa, que possibilitou para que todo este trabalho fosse concretizado; Agradeço à colega Alessandra Brunoro Motta por sua preciosa colaboração em compartilhar comigo seus ensinamentos e por toda a ajuda oferecida, especialmente por compartilhar seu trabalho de doutorado para que esta pesquisa pudesse ser realizada; Ao Laboratório de Terapia Comportamental do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, sob a responsabilidade da Professora Doutora Edwiges F. M. Silvares, pela Professora Doutora Márcia H. S. Melo e sua aluna Marina Monzani, a quem agradeço pelo curso sobre o sistema ASEBA e o
5 processamento das informações geradas pelo Child Behavior Checklist (6-18 anos); Agradeço também à Senhora Maria Lúcia Fajóli, secretária do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFES, por sua presteza e carinho em seu atendimento; Obrigada à Luciana S. Soprani e Renata N. Leal, nossas meninas da Informática, que tornaram possível a aplicação dos instrumentos no computador. Obrigada por estarem disponíveis nos momentos que a ajuda técnica era necessária; Às minhas queridas bolsistas de PIBIC/CNPq – Cibele M. C. de M. Cazelli, Kelly A. Silveira e Charlene Z. Vieira, o meu: “Muito obrigada!”. Certamente, sem o empenho e a dedicação de vocês, este trabalho não teria sido possível. Esse mérito é também de vocês; Agradeço ao Professor Romildo Rocha de Azevedo Jr., do Centro Universitário de Vila Velha, por sua disponibilidade e presteza em realizar toda a análise estatística em tempo hábil e por sua paciência e suas explicações claras e precisão; Um especial obrigado aos dirigentes do Hospital Infantil de Vila Velha “Dr. Alzir Bernardino Alves” (HIABA), por permitir que a coleta dos dados se realizasse em suas dependências, com as crianças internadas; E, por falar no HIABA, não poderia deixar de agradecer a todas as crianças e seus familiares que participaram desta pesquisa. Embora o momento de suas vidas não fosse o mais agradável, com a ajuda de vocês, esperamos que a internação de outros milhares de crianças será menos dolorosa e mais alegre;
6 Faço um agradecimento especial ao nosso grupo de pesquisa do PPGP/UFES. Foi nesse grupo que tudo começou no ano de 2002, quando fui selecionada para participar do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) da UFES, com bolsa do CNPq, trabalhando ao lado de alunas do Mestrado e Doutorado em Psicologia e suas bolsistas, sob o comando da Profa. Sônia. Graças à orientação de vocês para o desenvolvimento de suas pesquisas,
foi
possível
que
meu
interesse
na
área
crescesse
mais,
desenvolvendo minhas habilidades e aprimorando meus conhecimentos. Essa experiência me proporcionou que antes de terminar da graduação eu já estivesse matriculada e cursando o Mestrado em Psicologia da UFES; Agradeço aos meus pais e meu irmão por todo o apoio e incentivo para dar mais este passo na minha vida. Obrigada por me incentivar a sonhar e a correr atrás desse sonho e por me proporcionar a realização de vários deles; Em especial, agradeço ao Júnior, meu marido. Seu amor, carinho, apoio, palavras de incentivo, compreensão e dedicação foram essenciais para concluir essa tarefa e superar todas as dificuldades do caminho; Por fim, muito obrigada a todas as pessoas que direta e indiretamente contribuíram para a realização deste trabalho.
7 SUMÁRIO RESUMO............................................................................................ 16 ABSTRACT........................................................................................ 18 1
INTRODUÇÃO................................................................................... 20
1.1
Aspectos médicos e psicológicos da internação................................ 23
1.2
Coping e hospitalização..................................................................... 25
1.3
As atividades lúdicas e suas contribuições para o enfrentamento da hospitalização de crianças............................................................ 35
1.4
O uso de instrumentos informatizados para avaliação psicológica... 38
1.5
Justificativas....................................................................................... 41
1.6
Objetivos............................................................................................ 43
2
MÉTODO............................................................................................ 45
2.1
Participantes...................................................................................... 45
2.1.1 Critérios para seleção da amostra..................................................... 45 2.2
Local de coleta dos dados................................................................. 46
2.3
Instrumentos e Materiais.................................................................... 48
2.4
Procedimento..................................................................................... 55
2.5
Processamento e análise de dados................................................... 56
2.5.1 Processamento e análise descritiva dos dados................................. 56 2.5.1.1 Processamento e análise dos dados obtidos com o Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança................................................ 56 2.5.1.2 Processamento e análise dos dados obtidos com a Lista de Verificação Comportamental da Criança: CBCL - Child Behavior Checklist (6 a 18 anos)...................................................................... 58 2.5.1.3 Processamento e análise dos dados obtidos com o Instrumento Computadorizado
para
Avaliação
do
Brincar
no
Hospital:
ABHcomp........................................................................................... 60 2.5.1.4 Processamento e análise dos dados obtidos com o Instrumento Computadorizado
de
Avaliação
do
Enfrentamento
da
Hospitalização: AEHcomp.................................................................. 63 2.5.2 Análise estatística inferencial............................................................. 67
8 2.6
Avaliação ética de riscos e benefícios............................................... 68
3
RESULTADOS................................................................................... 70
3.1
Caracterização dos participantes....................................................... 70
3.2
Dados sobre a Rotina da Criança antes da internação..................... 71
3.3
Dados
sobre
problemas
de
comportamento
anteriores
à
hospitalização pelo CBCL (6-18 anos)............................................... 72 3.3.1 Escala de Competências (CBCL 6-18 anos)..................................... 74 3.3.2 Escala de Síndromes Comportamentais (CBCL 6-18 anos).............. 76 3.3.3 Escala Orientada pelo DSM-IV (CBCL 6-18 anos)............................ 78 3.4
Dados sobre as estratégias de enfrentamento da hospitalização..... 79
3.4.1 Análise das justificativas às respostas ao AEHcomp......................... 85 3.5
Dados das preferências lúdicas no hospital....................................... 89
3.5.1 Análise das justificativas das respostas ao ABHcomp....................... 92 3.6
Estatística inferencial......................................................................... 94
3.7
Resumo geral dos resultados............................................................ 97
3.8
Descrição de casos............................................................................ 101
3.8.1 Identificação: C19.............................................................................. 101 3.8.2 Identificação: C4................................................................................ 109 4
DISCUSSÃO...................................................................................... 117
5
REFERÊNCIAS.................................................................................. 135 APÊNDICES...................................................................................... 151
9 LISTA DE TABELAS
Tabela 1
Freqüência e porcentagem de crianças referidas como clínicas, e médias e desvios-padrão do T score nas escalas de problemas de comportamento do CBCL (6-18 anos).............................................. 73
Tabela 2
Proporções médias de escolhas das cenas do AEHcomp por tipo de
comportamentos
facilitadores
e
não-facilitadores
da
hospitalização (N = 28)..................................................................... 83 Tabela 3
Proporção média de comportamentos facilitadores e nãofacilitadores da hospitalização por criança, no AEHcomp................ 84
Tabela 4
Freqüência e porcentagem das estratégias de enfrentamento no AEHcomp......................................................................................... 86
Tabela 5
Proporção de cada categoria de coping da hospitalização, por criança, no AEHcomp....................................................................... 88
Tabela 6
Média e definição dos clusters relativos às preferências lúdicas no hospital, segundo crianças internadas, pelo ABHcomp (N = 28)..... 91
Tabela 7
Análise de variância entre pares de atividades lúdicas do ABHcomp escolhidas pelas crianças hospitalizadas........................ 92
Tabela 8
Freqüência e proporção das justificativas das crianças para a escolha e recusa das cenas com atividades lúdicas no hospital, pelo ABHcomp.................................................................................. 93
Tabela 9
Freqüência e proporção das justificativas das crianças para a escolha e recusa das cenas com atividades lúdicas no hospital, pelo ABHcomp, nas respostas explicativas...................................... 93
Tabela 10 Relações
entre
problemas
de
comportamento
prévios
à
hospitalização (CBCL 6-18 anos) e respostas de enfrentamento da hospitalização (AEHcomp)................................................................ 95 Tabela 11 Comparação entre grupos clínico e normal para problemas de comportamento (CBCL 6-18 anos), em termos de comportamento de enfrentamento da hospitalização (AEHcomp) e preferências lúdicas no hospital (ABHcomp) (N = 28)........................................... 96
10 Tabela 12 Análise de regressão logística entre as variáveis – patologia, rotina, características da criança e comportamentos facilitadores e não-facilitadores de enfrentamento da hospitalização...................... 97 Tabela 13 Respostas de C19 ao AEHcomp...................................................... 105 Tabela 14 Respostas de C19 ao ABHcomp...................................................... 108 Tabela 15 Respostas de C4 ao AEHcomp........................................................ 113 Tabela 16 Respostas de C4 ao ABHcomp........................................................ 115
11 LISTA DE FIGURAS Figura 1
Freqüência de crianças classificadas como clínicas ou normais nas Escalas de Competências do CBCL (6-18 anos) (N = 28)................ 75
Figura 2
Freqüência de crianças classificadas como clínicas ou normais nas oito escalas de Síndromes Comportamentais do CBCL (6-18 anos) (N = 28).............................................................................................. 77
Figura 3
Freqüência de crianças classificadas como clínicas ou normais nas Escalas de Problemas Internalizantes e Externalizantes do CBCL (6-18 anos) (N = 28). ........................................................................ 78
Figura 4
Freqüência de crianças classificadas como clínicas ou normais por Escalas de Transtornos Mentais Orientadas pelo DSM-IV, no CBCL (6-18 anos) (N = 28) ............................................................... 79
Figura 5
Freqüência de crianças por tipo de escolha das cenas do AEHcomp (N = 28) ........................................................................... 80
Figura 6
Freqüência de crianças por tipo de escolha dos comportamentos facilitadores da hospitalização, pelo AEHcomp (N = 28).................. 81
Figura 7
Freqüência de crianças por tipo de escolha dos comportamentos não-facilitadores da hospitalização, pelo AEHcomp.......................... 82
Figura 8
Freqüência de crianças por tipo de escolha das atividades lúdicas do ABHcomp (N = 28)....................................................................... 89
Figura 9
Pontuações de C19 na Escala de Competências do CBCL.............. 102
Figura 10 Pontuações de C19 na Escala de Síndromes do CBCL................... 103 Figura 11 Pontuações de C19 na Escala Orientada pelo DSM-IV do CBCL..... 104 Figura 12 Pontuações de C4 na Escala de Competências do CBCL................ 110 Figura 13 Pontuações de C4 na Escala de Síndromes do CBCL..................... 111 Figura 14 Pontuações de C4 na Escala de Problemas do CBCL...................... 112 Figura 15 Pontuações de C4 na Escala Orientada pelo DSM-IV do CBCL....... 112
12 LISTA DE APÊNDICES Apêndice A
Termo de consentimento para a participação em projeto de pesquisa.................................................................................. 151
Apêndice B
Ficha de Identificação da Criança........................................... 153
Apêndice C
Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança................ 156
Apêndice D
Exemplos de Cenas do AEHcomp na Versão Menino............ 160
Apêndice E
Exemplos de Cenas do AEHcomp na Versão Menina............ 161
Apêndice F
Folha
de
registro
Informatizado
de
das
respostas
Avaliação
do
ao
Instrumento
Enfrentamento
da
Hospitalização – AEHcomp..................................................... 162 Apêndice G
Módulo de Autoria do ACAAPSI............................................. 163
Apêndice H
Módulo Avaliador do ACAAPSI............................................... 165
Apêndice I
Exemplos de Cenas do ABHcomp na Versão Menino............ 171
Apêndice J
Exemplos de Cenas do ABHcomp na Versão Menino............ 172
Apêndice K
Folha
de
registro
das
respostas
ao
Instrumento
Informatizado de Avaliação do Brincar no Hospital – ABHcomp................................................................................ 173 Apêndice L
Processamento e análise dos dados obtidos com o Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança................ 174
Apêndice M
Folha de registro das respostas, justificativas e classificação das justificativas do Instrumento Informatizado de Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização...................................... 175
Apêndice N
Regras para a classificação das justificativas do AEHcomp... 176
Apêndice O
Categorias de análise das estratégias de enfrentamento da hospitalização......................................................................... 178
Apêndice P
Resultados dos índices de concordância entre três juízes na categorização
das
estratégias
de
enfrentamento
da
hospitalização......................................................................... 184 Apêndice Q
Folha de registro das respostas, justificativas e classificação das justificativas do Instrumento Informatizado de Avaliação do Brincar no Hospital............................................................. 185
13 Apêndice R
Resultados dos índices de concordância entre três juízes na categorização dos dados do ABHcomp.................................. 186
Apêndice S
Parecer do Comitê de Ética do Programa de PósGraduação em Psicologia....................................................... 187
Apêndice T
Caracterização dos participantes e quadros clínicos.............. 188
Apêndice U
Dados individualizados do Protocolo de Caracterização da Rotina das Crianças................................................................ 191
Apêndice V
T Scores individualizados por criança no CBCL..................... 192
Apêndice W
Dados individualizados por criança com média da Escala de Competências do CBCL (6-18 anos)...................................... 194
Apêndice X
Dados individualizados por criança com média da Escala de Síndromes do CBCL (6-18 anos)............................................ 195
Apêndice Y
Dados individualizados por criança com média da Escala de Problemas do CBCL (6-18 anos)............................................ 196
Apêndice Z
Dados individualizados por criança com média da Escala Orientada pelo DSM-IV do CBCL (6-18 anos)........................ 197
Apêndice Aa
Proporção média de respostas ao AEHcomp, por criança..... 198
Apêndice Ab
Respostas de cada criança, por categoria de coping, no AEHcomp................................................................................ 200
Apêndice Ac
Respostas das escolhas, com média, no ABHcomp por criança..................................................................................... 202
Apêndice Ad
Classificação das justificativas do ABHcomp por criança....... 204
Apêndice Ae
Conceituação hierárquica da estrutura de enfrentamento...... 206
Apêndice Af
Exemplo de diagrama com a sistematização hierárquica do enfrentamento......................................................................... 207
14 LISTA DE SIGLAS A
Acoplagem
AAM
Aspectos afetivo-motivacionais
ABH
Avaliação do Brincar no Hospital
ABHcomp
Instrumento Informatizado de Avaliação do Brincar no Hospital
ACAAPSI
Ambiente de Apoio a Avaliações Psicológicas
AD
Atividades Diversas
ADM
Assessment Data Manager
AEH
Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização
AEHcomp
Instrumento Informatizado de Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização
APA
American Psychological Association
ASEBA
Achenbach System of Empiracally Based Assessment
ASO
Afastamento Social
BIN
Busca por informação
BRI
Contexto da Brincadeira
BSU
Busca por suporte
CAPES
Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior
CBCL
Child Behavior Checklist
CES
Conseqüência específica
CNPq
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CRI
Característica da criança
DEL
Delegação
DES
Desamparo
DIS
Distração
DSM-IV
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 4ª edição
E
Exercício
ES
Espírito Santo
ESQ
Esquiva
FAM
Contexto familiar
HIABA
Hospital Infantil de Vila Velha “Dr. Alzir Bernardino Alves”
HOS
Ambiente hospitalar
15 IC
Iniciação científica
InC
Índice de concordância
Md
Mediana
NEG
Negociação
NEX
Resposta não-explicativa
O(A)
Outros – restrição do ambiente
O(C)
Outros – característica da criança
OMS
Organização Mundial de Saúde
OPO
Oposição
PCRC
Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança
PETI
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
PIBIC
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica
PPGP
Programa de Pós-Graduação em Psicologia
R
Regras
RCO
Reestruturação cognitiva
REM
Regulação da emoção
RUM
Ruminação
S
Simbólico
SPR
Solucionar problema
SUS
Sistema Único de Saúde
TDAH
Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade
UFES
Universidade Federal do Espírito Santo
UFRGS
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
16 Moraes, Elissa Orlandi (2007, setembro). Avaliação do enfrentamento da hospitalização em crianças por meio de instrumentos informatizados. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Psicologia, Centro de Ciências Humanas e Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo. Vitória, ES, 207p.
RESUMO A hospitalização infantil pode desencadear problemas psicológicos, como depressão e stress, por mudanças acentuadas na rotina e exposição a procedimentos invasivos. É relevante, então, identificar as estratégias de enfrentamento da hospitalização, com ênfase no brincar como facilitador da adaptação da criança. A avaliação psicológica no hospital implica controlar diversas variáveis, sendo facilitada pela informática. Esta pesquisa analisou as estratégias de enfrentamento da hospitalização e atividades lúdicas preferidas, por instrumentos informatizados. Participaram 28 crianças (20 meninos; 6-12 anos) internadas em hospital público de Vila Velha/ES e seus pais. Estes responderam o Child Behavior Checklist (CBCL 6-18 anos) e dados da rotina das crianças, que responderam instrumentos de Avaliação Informatizada do Enfrentamento da Hospitalização (AEHcomp), com 20 cenas facilitadoras e nãofacilitadoras da hospitalização, e Avaliação Informatizada do Brincar no Hospital (ABHcomp), com 20 atividades lúdicas. Obtiveram-se dados sobre patologias e internações. Foram referidas como clínicas 17 crianças na Escala de Síndromes do CBCL. As brincadeiras mais escolhidas (ABHcomp) foram: assistir TV (média = 3,4) e minigame (média = 3,0), justificadas por respostas não-explicativas (50,2%) ou pelo contexto da brincadeira (19,6%). No AEHcomp, houveram mais respostas
17 facilitadoras à hospitalização (média = 1,8), como conversar (100%) e tomar remédio (100%), do que não-facilitadoras (média = 0,9), como ficar triste (71,4%) e chorar (75%). Entre 13 estratégias de enfrentamento, ruminação (28,6%) e distração (20,1%) foram mais freqüentes. Não houve correlações entre problemas de
comportamento
facilitadores.
anteriores
à
hospitalização
e
comportamentos
não-
Houve correlação significativa dos comportamentos facilitadores
somente com a idade e com as mudanças na rotina. Esta avaliação pode subsidiar intervenções com crianças, prevenindo danos emocionais gerados pela hospitalização. Financiamento: CAPES (bolsa de Mestrado). Palavras-chaves: 1) Estratégias de enfrentamento da hospitalização; 2) Hospitalização infantil; 3) Avaliação psicológica computadorizada.
18 Moraes, Elissa Orlandi (2007, september). Assessment of child hospitalization coping through IT-based instruments. Masters Thesis, Postgraduation Program in Psychology, Human and Natural Science Department at the Federal University of Espírito Santo. Vitória, ES, 207p. ABSTRACT Child hospitalization may bring about psychological problems, such as depression and stress due to routine changes and invasive procedures. It is worth, then, identifying the hospitalization coping strategies, emphasizing the playing as a facilitator of the child adjustment to the hospital setting. The psychological assessment in the hospital environment implies in controlling several variables; and it is made easier by means of IT based resources. This research analyzed the hospitalization coping strategies and playful activities by means of IT instruments. Twenty-eight (28) children (20 boys; aged 6-12) admitted to a public hospital in the city of Vila Velha/ES and their parents were subjects of this research. They answered the Child Behavior Checklist (CBCL, aged 6-18) as well as provided data about the routine of their children who in turn answered Hospitalization Coping IT Based Instruments (AEHcomp), with 20 facilitating and non-facilitating hospitalization scenarios, in addition to the IT Based Assessment of Playing Activities in the Hospital (ABHcomp), with 20 playful activities. Data about pathologies and hospital admissions was gathered. Seventeen (17) children were referred to in the CBCL. The plays chosen most often (ABHcomp) were: watching TV (average = 3,4) and playing minigame (average = 3,0), supported by nonexplanatory answers (50,2%) or by the play context (19,6%). The AEHcomp, presented more facilitating answers to the hospitalization (average = 1,8), such as
19 talking (100%) and taking medicine (100%), than non-facilitating (average = 0,9), as being sad (71,4%) and crying (75%). Among 13 coping strategies, rumination (28,6%) and distraction (20,1%) were the most common. There were no correlations between behavioral problems prior to the hospitalization and nonfacilitating behaviors. There was a significant correlation of facilitating behaviors only related to age and routine changes. This assessment may provide subsidies in intervention towards children, thus preventing emotional damages caused by the hospital setting. Funding: CAPES (Masters scholarship). Key Words: 1) Hospitalization coping strategies; 2) Child Hospitalization; 3) IT Based Psychological Assessment.
20
INTRODUÇÃO A Psicologia da Saúde vem há tempos investigando a compreensão sobre o desenvolvimento físico, emocional, social e cognitivo das crianças. Essa atenção é extremamente importante devido à condição que uma internação impõe: afastamento de sua vida cotidiana e da família; promoção de um confronto com a dor, a limitação física e a passividade; implicações de algumas mudanças na rotina, e também da rotina de sua família (Miltre & Gomes, 2004). Num primeiro momento, percebe-se uma reação de espanto e perplexidade da família em ver seu filho internado, pois a infância é considerada uma fase saudável da vida de uma pessoa, em que se espera que o indivíduo tenha um desenvolvimento sem doenças graves e sem riscos de vida. A intervenção do psicólogo pode auxiliar a equipe médica ao informar o paciente sobre sua doença e a necessidade da realização de exames, além de permitir que o mesmo expresse seus sentimentos, fantasias, medos e inseguranças, intervindo como um mediador entre o paciente, sua família, e a equipe médica. O psicólogo pode aliviar o sofrimento do paciente e diminuir as conseqüências traumáticas da hospitalização (Crepaldi & Hackbarth, 2002; Pedromônico, 2006). Os incômodos que a criança tem ao estar internada são, dentre muitos outros, estar diante de tantas regras e normas que devem ser obedecidas num hospital, que é visto como um local de proibições. A tendência, muitas vezes é contestálas, desafiá-las ou até mesmo burlá-las. Questionam-se os horários préestabelecidos, a rotina rígida e as normas, queixa-se da comida, das roupas e da ociosidade durante a internação, e surge uma grande necessidade de desafiar os
21 pais ou alguma autoridade do hospital (Guzman & Cano, 2000). O que se observa, muitas vezes, é uma necessidade de obter atenção, pois, em certos casos, ocorre um abandono da família, como forma de tentar superar o problema, gerando outro, talvez até maior, que é a não-adesão ao tratamento por parte do paciente. Também se observa com freqüência que, quando há a internação, o paciente tem a necessidade de se sentir amparado e protegido, sobretudo pelas pessoas que já ocuparam esse papel, assim, procuram pela atenção e carinho dos pais, irmãos e demais familiares (Santos & Sebastini, 2001). Dentro desse quadro da hospitalização, pode-se observar o surgimento de algumas patologias associadas, como a depressão, oriunda de uma limitação das funções diárias, da privação do convívio com os amigos e familiares e da anulação da individualidade, além do cumprimento indesejado de normas, regras e horários (Guimarães, 1998; Stoudemire & Hales, 2000). Observa-se também que os sintomas de ansiedade e stress em relação aos procedimentos (muitas vezes dolorosos), ao tratamento e à adaptação à doença (quando esta é crônica) melhoram quando os pacientes têm a oportunidade de serem acompanhados por um suporte psicológico. Este proporciona uma melhor expressão e compreensão de seus sentimentos e conseqüentemente um melhor controle da dor, da ansiedade e da depressão, assim como uma melhor aceitação de si (Ceccim, Cristófoli, Kulpa & Modesto, 1997; Leverson & Bemis, 2000). Diante desse quadro, é relevante identificar e analisar as reações das crianças ao contexto da hospitalização, assim como os efeitos desta no seu desenvolvimento.
22 1.1 Aspectos médicos e psicológicos da hospitalização Estudos têm mostrado que variáveis psicológicas podem afetar condições médicas, contribuindo para o surgimento e o desenvolvimento de doenças (Stoudemire & Hales, 2000). Em revisão de literatura sobre o tema, esses autores verificaram que a influência das variáveis psicológicas pode acontecer de diversas maneiras: (a) predisposição para o aparecimento de doenças; (b) causa direta; (c) facilitador ou não do tratamento; e (d) conseqüência das condições médicas. Essa perspectiva contribuiu para a inserção do psicólogo nas instituições de saúde e sua atuação foi ampliada para além da atenção à saúde mental, passando a abranger a área de saúde geral. A ausência de desafios cognitivos decorrentes de uma internação pode promover alterações em diversas áreas como memória, concentração, atenção, coordenação motora fina, linguagem e inteligência, causando, com isso, alguns distúrbios da aprendizagem. A hospitalização é vista como ameaçadora e causadora de ansiedade. Quanto menor a criança, maior o risco de desenvolver sintomas de ansiedade devido a maior dificuldade de compreender a situação, pois as mesmas tendem a acreditar que a doença costuma ser uma punição à desobediência, principalmente quando menores de sete anos e meio (Barros, 1998; Chen, Zeltzer, Craske & Katz, 1999, 2000; Claar, Walker & Smith, 2002; Crepaldi, Rabuske & Gabarra, 2006; Munhoz & Ortiz, 2006). Mudanças nos comportamentos de crianças hospitalizadas variam de acordo com sua idade e, sem uma devida avaliação esses comportamentos podem perdurar por toda a internação e até mesmo após a alta (Golden, 1983). Em crianças pequenas, com idade entre um e cinco anos, por exemplo, a
23 hospitalização
acarreta
reações
físicas,
como
choro,
vômitos,
diarréia,
taquicardia, inapetência, insônia, enurese noturna, e emocionais, tais como: indiferença,
medo,
apatia,
agressividade
e
irritabilidade,
quadros
esses
acentuados quando estão desacompanhadas dos pais (Oliveira, Dantas & Fonsêca, 2005). As crianças podem também recusar alimentos sólidos, apresentar diminuição do vocabulário, perda do controle dos esfíncteres, além de outras reações emocionais (Sadala & Antônio, 1995). Assim, segundo Lima (1985), a hospitalização, em maior ou menor grau, repercute no desenvolvimento emocional da criança, tanto positiva como negativamente. Pode-se identificar que internações de crianças, por um período superior a cinco dias, a hospitalização de crianças com doença crônica podem desenvolver problemas psicológicos ou de comportamento (Dias, Baptista & Baptista, 2003). Tais transtornos podem caracterizar-se por distúrbios comportamentais temporários, porém capazes de levar a uma importante alteração no desenvolvimento. Os estudos na área apontam que o paciente com doença crônica ou internado por longo período percebe muitas perdas em sua vida: a perda de um corpo saudável, a perda de papéis ou responsabilidades, a perda dos sonhos e a possibilidade de um menor tempo de vida, afetando a adaptação emocional e social do indivíduo (McDaniel, Hepworth, & Doherty, 1994; Santos & Sebastini, 2001). Nesse processo, a internação é sentida como uma agressão, pois ela se instala de forma abrupta e inesperada, e não permite uma adaptação gradativa à realidade. Quando sujeita a uma hospitalização, a criança percebe que sua rotina pode sofrer mudanças. Também há mudanças no sistema biopsicossocial, além da
24 interrupção do desenvolvimento intelectual, afetivo e da personalidade. Essas alterações provocam conseqüências de ordem emocional, pois a adaptação a esse novo ambiente é um processo longo e a criança não sabe muito bem como lidar com os novos sentimentos que surgem (Eiser, 1992; Munhoz & Ortiz, 2006). As alterações na rotina provocadas pela hospitalização podem ser exemplificadas
pela
imposição
do repouso,
limitação
das
atividades
e
descontinuidade das experiências sociais da criança (Munhoz & Ortiz, 2006). Nesse contexto, é relevante o estudo das estratégias de enfrentamento (coping) utilizadas pelos pacientes. 1.2 Coping e hospitalização Em nosso dia-a-dia, é muito difícil evitarmos as situações estressantes e aflitivas, pois tais situações estão presentes em nossa vida, no trabalho e nos relacionamentos. Essas situações também podem ser prejudiciais para a nossa saúde e esses efeitos podem ser evitados e/ou reduzidos dependendo da forma como lidamos com eles. As pessoas que conseguem adotar, em sua vida, boas táticas de enfrentamento das situações tendem a adoecer menos, ter menos infecções e perder menos dias na escola ou no trabalho (Folkman, 2001). Denomina-se coping a tática utilizada para enfrentar determinadas situações. O conceito de coping é definido por Antoniazzi, Dell’Aglio e Bandeira (1998, p. 274) como “(...) o conjunto das estratégias utilizadas pelas pessoas para adaptarem-se a circunstâncias adversas”. Esse conjunto de esforços – cognitivos e comportamentais – é utilizado com o objetivo de lidar com situações específicas, que surgem em situações de stress e sobrecarregam os recursos pessoais. Esse esforço para aliviar os agentes estressores varia de acordo com o
25 desenvolvimento da pessoa de acordo com as experiências vivenciadas. Esse processo pressupõe a análise de como a doença é percebida, interpretada e representada pelo indivíduo (Antoniazzi et al., 1998; Dell’Aglio, 2003). Ainda de acordo com Antoniazzi et al. (1998), três gerações de pesquisadores têm se dedicado ao estudo do coping. A primeira geração, datada do início do século XX compreendia que o coping estava correlato aos mecanismos de defesa do ego, num primeiro momento, sendo o coping concebido como estável e rígido, como mostram os estudos de Tapp (1985) e de Vaillant (1994). Posteriormente, foi entendido como mais flexível e proposital, adequando-se à realidade. A segunda
geração
de
pesquisadores,
a
partir
de
1960,
enfatizou
os
comportamentos de coping e seus determinantes cognitivos e situacionais, sendo visto como um processo transacional entre a pessoa e o ambiente; alguns dos autores dessa abordagem são Folkman e Lazarus (1980). A terceira geração, a partir da década de 1990, voltou-se para o estudo das correlações entre coping e personalidade, pois fatores situacionais não são capazes de explicar toda a variação nas estratégias de enfrentamento utilizadas pelos indivíduos, como mostram os estudos de O'Brien e DeLongis (1996) e de Watson e Hubbard (1996). Apesar das diferentes visões de coping, todas elas convergem para alguns pontos: (a) o coping tem múltiplas funções, dentre elas a regulação da angústia e o manejo dos problemas causados; (b) o coping é muito influenciado pela avaliação
do
contexto
estressante
característico,
assim
como
sua
controlabilidade; (c) o coping é influenciado por características pessoais, tais
26 como, o otimismo, o neuroticismo e a extroversão; e (d) o coping é influenciado pelos recursos sociais de que o indivíduo dispõe (Folkman, 2001). Na presente pesquisa, será adotado o modelo de coping proposto por Folkman e Lazarus (1980), que envolve quatro aspectos principais: (a) coping como um processo entre indivíduo e ambiente; (b) sua funcionalidade é administrar ao invés de controlar a situação aversiva; (c) seus processos implicam em como a situação é percebida e interpretada pelo indivíduo; (d) o processo de coping se compõe de uma mobilização de esforços cognitivos e comportamentais para administrar (reduzir, minimizar ou tolerar) os sentimentos que surgem a partir da interação com o ambiente. Os pesquisadores da área argumentam que o modo como as pessoas lidam com o stress pode reduzir ou amplificar os efeitos adversos da vida (Rudolph, Dennig & Weisz, 1995; Skinner, Edge, Altman & Sherwood, 2003). Segundo Compas, Connor-Smith e Saltzman (2001), o coping possui três dimensões. A primeira envolve esforços ativos para alcançar algum controle pessoal sobre os aspectos estressantes do ambiente e sobre sua emoção. A segunda dimensão envolve esforços para adaptar uma situação através de métodos cognitivos de reestruturação, de aceitação ou de distração, por meio de pensamentos e atividades positivas. A terceira dimensão envolve respostas de evitação ou de desligamento do fator estressor ou de sua emoção. É importante distinguir o que os estudiosos têm denominado como estratégias de enfrentamento e estilos de enfrentamento. As “estratégias de enfrentamento” se referem às ações cognitivas ou de comportamento tomadas frente a uma situação específica, sendo vinculadas a fatores situacionais, enquanto que “estilos
27 de enfrentamento” se relacionam às características da personalidade do indivíduo (Folkman, 2001). As estratégias de enfrentamento, que serão investigadas nesta pesquisa, refletem ações, comportamento e/ou pensamentos usados para lidar com o agente estressor. Dependendo da sua função, as estratégias de enfrentamento podem ser classificadas em dois níveis, segundo Folkman e Lazarus (1980): focalizadas na emoção e no problema. O primeiro nível é definido como um esforço para regular o estado emocional associado ao agente estressor, enquanto que o segundo se constitui em esforço para atuar na situação que deu origem ao stress. Em situações de intervenção, o coping focalizado no problema é empregado em situações modificáveis, na qual algo pode ser feito, direcionando seus esforços para a resolução de um problema ou fazer algo que altere a fonte causadora de stress. Nesse caso, as respostas dos indivíduos podem ser, por exemplo: planejar suas ações e enfrentar diretamente o problema. Já o coping focalizado na emoção é utilizado em situações inalteráveis, na qual as situações precisam ser aceitas; nesse caso, os esforços são direcionados para a redução e/ou o manejo do desconforto emocional que uma situação de stress pode causar. Para esse tipo de situação, as respostas apresentadas referem-se a uma mudança de pensamento, para uma posterior mudança de comportamento, e tais respostas podem ser, por exemplo: a negação, a reestruturação ou reinterpretação de eventos e a busca por suporte social (tanto para busca de conselhos, quanto para busca de conforto emocional). Observa-se, dessa forma, que o coping focado na emoção pode facilitar o coping focalizado no problema por aliviar a tensão e, igualmente, o contrário: pode diminuir a ameaça e, assim, reduzir a tensão
28 emocional (Antoniazzi et al., 1998; Carver, Scheier & Weintraub, 1989; Folkman, 2001). Vale ressaltar que a expressão coping refere-se ao lidar com uma situação ou problema. A tradução para o português que mais se aproxima com o significado do termo original é estratégia de enfrentamento; porém, este pode dar a impressão de que apenas as ações dirigidas à resolução de problemas são consideradas. Nesta pesquisa, o termo estratégia de enfrentamento é usado de acordo com o entendimento que é atribuído ao coping, ou seja, considerando todas as formas de se lidar com problemas, adequadas ou não. O coping é um processo dinâmico, que tem por característica a mudança qualitativa, dependendo: (a) se o evento em questão é prejudicial ou ameaçador; (b) dos papeis sociais desempenhados; e (c) dos fatores sociais e ambientais que influenciam o evento (Folkman, 2001). De acordo com Folkman (2001), existem algumas questões referentes à possibilidade do coping afetar o humor. Segundo essa autora, o coping é usado para explicar mudanças no humor ao longo do tempo. A literatura sobre coping e saúde indica a crença de que os tipos de coping estão, de alguma forma, relacionados com a saúde. Podemos observar que seus efeitos diretos são pouco freqüentes e estão mais limitados às ações de coping que podem prejudicar a saúde. Por outro lado, os efeitos indiretos são mais freqüentes e estão associados ao humor, o qual pode afetar o comportamento saudável e conseqüentemente a saúde. A maior parte dos estudos sobre coping trata apenas de adultos. Entretanto, especificamente em crianças, o processo de coping precisa ser entendido
29 levando-se em conta o contexto social e familiar, as características da criança, sua idade, seu estágio de desenvolvimento, as características da doença, assim como a compreensão da criança sobre a mesma (Barros, 1998; Gabarra, 2005; Murteira, 2004; Oliveira, 1993; Oliveira et al., 2005). Geralmente, os estressores das crianças são diferentes daqueles relacionados aos adultos (Compas, 1987; Compas et al., 2001; Compas, Malcarne & Fondacaro, 1988). As primeiras tentativas de verificar o stress em crianças focalizaram os eventos negativos em suas vidas e os sintomas psicológicos causados por esses eventos, sem considerar seus esforços para superá-los. Todavia, os resultados das pesquisas contemporâneas apontam que crianças podem apresentar diferentes sintomas ao enfrentarem os eventos de vida negativos, isso devido a suas estratégias de coping e suas características de personalidade (Band & Weisz, 1988; Dell’Aglio, 2003). Os estudos de coping com crianças têm investigado eventos de vida considerados estressantes, como, por exemplo, situações com pais (divórcio) e outros
familiares,
os
resultados
escolares,
as
consultas
médicas
e/ou
odontológicas, a hospitalização e situações que estão fora do controle e que são difíceis de serem modificadas pela própria criança (Dell’Aglio, 2003). O nível de desenvolvimento cognitivo também é um fator que influencia a utilização de determinadas estratégias, assim como é possível identificar diferenças entre meninos e meninas (Dell’Aglio, 2003). As meninas tendem a utilizar mais estratégias de coping voltadas para a estabilidade emocional, enquanto que os meninos procuram agir de forma ativa sobre o estressor (Altshuler, Genevro,
30 Ruble & Bornstein, 1995; Curry & Russ, 1985; Dell’Aglio & Hutz, 2002a, 2002b; Savoia & Bernik, 2004; Seidl, Tróccoli & Zannon, 2001). Outra diferença que podemos identificar nas crianças é que a habilidade de coping focalizada no problema parecer ser adquirida mais cedo, dos anos préescolares até aproximadamente os 10 anos. Já a habilidade de coping focalizada na emoção aparece frequentemente mais tarde e se desenvolve durante a adolescência. Isso parece se relacionar com o fato de crianças muito pequenas ainda não terem consciência de seus estados emocionais e não conseguirem regular suas emoções. Com o passar do tempo, a criança adquire mais consciência sobre seus pensamentos e estratégias, expandindo seu repertório de respostas às situações estressantes. Crianças com 6 anos de idade já são suficientemente conscientes dos eventos estressantes em suas vidas e capazes de falar sobre seus esforços de coping. Crianças de cinco a 12 anos apresentam predominantemente comportamentos de distração como estratégia de coping. A capacidade mais complexa de pensamento só aparece a partir dos 11 anos e, assim se tornam mais independentes e procuram menos o apoio de outras pessoas. Os métodos de coping das crianças são mais específicos e estão de acordo com o desenvolvimento das habilidades cognitivas, sociais e regulação da emoção. Entre as estratégias mais freqüentes, podemos identificar o controle do perigo, busca de apoio, solução de problema e distração, enquanto que as menos freqüentes envolvem a agressão, autodestruição e afastamento. É interessante destacar um aspecto do coping infantil que é que o comportamento de evitação e as estratégias focalizadas na emoção que podem funcionar de forma adaptativa, quando a criança não pode mudar a situação ou quando evoca muita emoção,
31 sendo uma tentativa de manter o controle sobre a situação. (Dell’Aglio, 2003; Thompson & Gustafson, 1996). Estudos indicam que crianças, por volta dos 6 anos de idade, usam menos estratégias de coping focalizado na emoção que crianças maiores de 9 anos, quando há um declínio significante na proporção de respostas de evitação para situações médicas e, em contrapartida, há um aumento na direção da resolução do problema. Assim como encontrado na literatura sobre adultos, a situação que evoca o coping focalizado no problema são aqueles percebidos como mais controláveis, entretanto, a situação médica evoca mais freqüentemente o coping focalizado na emoção. Autores como Band e Weisz (1988) sugerem que o coping focalizado na emoção pode se desenvolver mais devagar, em parte devido à necessidade de maturidade cognitiva. No contexto da hospitalização, as crianças utilizam diversas estratégias de enfrentamento consideradas facilitadoras
ou não-facilitadoras, como, por
exemplo, procurar por informações sobre a doença ou fazer chantagem utilizando a condição de estar doente para obter algo (Costa Jr., 2005; Manne, Bakeman, Jacobsen & Redd, 1993; Motta & Enumo, 2002; Peterson, 1989; Peterson, Sherman & Zink, 1994; Trask, Paterson, Trask, Bares, Birt & Maan, 2003). Neste último caso, devem ser analisados os “ganhos secundários da doença”, em que a criança tenta conseguir privilégios e certos benefícios dos profissionais de saúde, dos familiares, dos amigos e da escola (Santos & Sebastini, 2001). Skinner et al. (2003) revisaram 89 pesquisas realizadas entre 1969 e 2001, considerando que o estudo sobre o enfrentamento é fundamental para a compreensão de como o stress afeta a vida das pessoas. A partir dessa revisão,
32 os autores propuseram 13 categorias de coping, avaliadas como apresentando definições claras, mutuamente exclusivas e relativamente exaustivas: 1) resolução do problema - abrange a ação instrumental voltada à solução do problema, com o estabelecimento de estratégias, planejamento, análise lógica, esforço, persistência e determinação; 2) busca por suporte – caracteriza-se pela busca de apoio (pais, amigos, profissionais, Deus e outras fontes), com o objetivo de conselho, conforto e contato; 3) evitação – inclui esforços para manter-se distante da fonte geradora de stress; 4) distração – abarca o envolvimento em atividades prazerosas; 5) reestruturação cognitiva – por meio de mudanças de pensamento promove uma tentativa de ver o lado positivo da situação estressante; 6) ruminação - focaliza nos aspectos negativos da situação estressante; 7) desamparo – inclui desânimo, pessimismo e passividade frente à hospitalização; 8) afastamento social – busca de ações cujo objetivo é afastar-se das pessoas ou prevenir que as pessoas tomem conhecimento sobre a situação estressante e seus efeitos psicológicos; 9) regulação da emoção – inclui esforços para influenciar e expressar as emoções de modo apropriado; 10) busca por informação – abrange esforços para aprender mais sobre a situação estressante;
33 11) negociação – caracteriza-se por tentativas ativas de fazer um acordo entre suas necessidades e as restrições impostas pela situação estressante; 12) oposição - abrange os comportamentos de projeção, agressão, reação de raiva, descarga e atribuição de culpa as outras pessoas; e 13) delegação - relativo à dependência, busca mal-adaptativa por ajuda, reclamações e queixas, resmungos e autopiedade. Analisando os estudos sobre a avaliação do enfrentamento em crianças, observam-se propostas relacionadas a: (a) avaliação de problemas de saúde, como: hospitalização para cirurgia eletiva (Altshuler et al., 1995), dor decorrente de doenças oncológicas (Blount, Sturges & Powers, 1990; Costa Jr., 2001; Manne et al., 1993; McCaffrey, 2006; Motta & Enumo, 2004b; Tucker, Slifer & Dahlquist, 2001; Weisz, McCabe & Dennig, 1994), dor e sofrimento decorrentes da exposição a procedimentos médicos invasivos (Cohen, Blount, Cohen & Johnson, 2004; McClellan, Cohen & Joseph, 2003), dor decorrente de doenças gastrointestinais (Walker, Smith, Garber & Van Slyke, 1997) e reumatológicas (Varni et al., 1996), e tratamento odontologico (Brown, O´Keeffe, Sanders & Baker, 1986; Curry & Russ, 1985; Moraes, Possobon, Costa Jr., Fonseca, Silva & Rolim, 2006); e (b) avaliação de estressores da vida cotidiana, previamente definidos ou auto-relatados (Ayres, Sandler, West & Roosa, 1996; Band & Weisz, 1988; Brodzinsky, Elias, Steiger, Simon, Gill & Hitt, 1992; Brown et al., 1986; Causey & Dubow, 1992; Compas et al., 1988; Dise-Lewis, 1988; Lima, Lemos & Guerra, 2002; Rossman, 1991).
34 As estratégias de enfrentamento podem tornar possível a preservação da imagem corporal positiva diante da adversidade, auxiliando na manutenção do equilíbrio emocional e no relacionamento satisfatório com os profissionais de saúde, com a família e com amigos. Resumidamente, as estratégias de enfrentamento têm por objetivo manter o bem-estar do indivíduo através de mecanismos
que
amenizem
os
efeitos
estressantes
da
doença
e da
hospitalização (Santos & Enumo, 2003). É importante lembrar que a resposta da criança à situação de hospitalização depende das estratégias de coping e também de fatores inerentes à criança, como a idade e o estágio de desenvolvimento, assim como das experiências anteriores de separação da família, além das características da própria doença e da compreensão desta, e também dos hábitos familiares (Barros, 1998; Gabarra, 2005; Murteira, 2004; Oliveira et al., 2005). Nesse contexto, algumas intervenções facilitam a adaptação da criança à hospitalização, segundo Murteira (2004) e Brazelton (1998), como: (a) a preparação para a internação hospitalar, fornecendo informações à criança e seus pais, visando também incentivar a expressão de sentimentos e de dúvidas e estabelecer uma relação de confiança; (b) integração no espaço físico, permitindo à criança conhecer o ambiente onde vai ficar internada, incluindo ser apresentada aos profissionais de saúde; (c) organização das atividades diárias, sem sobrecarregar a criança, mas estabelecendo-se uma rotina, para que a criança não se sinta desamparada e ansiosa; (d) preparação para procedimentos dolorosos e invasivos, de forma adequada à idade e ao desenvolvimento da
35 criança, também incluindo os pais; (e) brincar, como atividade promotora da adaptação à hospitalização. Assim, entre as estratégias de enfrentamento propostas para crianças hospitalizadas está o brincar, pois, por meio dessa atividade, a criança tem a possibilidade de reduzir o stress e a ansiedade gerada pela internação além de prevenir outros problemas associados, como a depressão (Brown, 2001; Golden, 1983; Pinheiro & Lopes, 1993; Wong, 2005). 1.3 As atividades lúdicas e suas contribuições para o enfrentamento da hospitalização de crianças Gomes e Almeida (2001) distinguem as atividades lúdicas em: (a) brincadeira: refere-se à ação de brincar, sendo um comportamento espontâneo que resulta numa atividade não estruturada; (b) jogo: refere-se a uma brincadeira com regras; (c) brinquedo: refere-se ao objeto utilizado ao brincar; e (d) atividade lúdica: envolve todas as anteriores. Uma nova terminologia foi criada para contemplar esses conceitos, designada como “atividade recreativa” (Munhoz & Ortiz, 2006). O brincar é uma atividade que ocupa um tempo importante na vida da criança, é um comportamento natural, e tem um papel muito importante para seu desenvolvimento físico, emocional, cognitivo, lingüístico e social; além disso, facilita a aprendizagem e orienta os profissionais a como ajudar as crianças a lidarem com seus problemas emocionais (Wong, 2005). O brincar, no contexto da hospitalização infantil, aparece como uma possibilidade de expressão de sentimentos, preferências, anseios e hábitos; é uma mediação entre a criança e o mundo, que agora se apresenta hostil e ameaçador. Para que o brincar ocorra no hospital, é necessário também que medidas “humanizadoras” sejam colocadas
36 em prática, para amenizar o sofrimento de crianças hospitalizadas. Entre essas medidas, tem-se o adequado apoio da equipe de saúde e da família à criança, a adequação do espaço físico, que deve ser alegre e estimulante, a oferta de recreação, entre outras. O brinquedo facilita a intervenção psicológica e incentiva atividades produtivas e expressivas, preparando a criança para a hospitalização, cirurgias, além de amenizar sentimentos relacionados à hospitalização (Brown, 2001; Chiattone, 1984; Miltre & Gomes, 2004; Pinheiro & Lopes, 1993). O brincar tem uma importância muito grande, pois por meio dessa atividade a criança pode aprender novos conceitos, adquirir informações e até mesmo superar dificuldades de aprendizagem. Além disso, a entrevista utilizando atividades lúdicas facilita a comunicação entre o psicólogo e a criança, sendo um instrumento de grande valia no contexto hospitalar (Crepaldi et al., 2006; Munhoz & Ortiz, 2006). Entre os benefícios da implantação de programas que incluem o brincar na rotina de hospitais infantis, tem-se: a redução da ansiedade associada à doença e à hospitalização, uma maior cooperação da criança com os exames e procedimentos médicos, menor resistência a outras internações, além disso, tranqüilizar a família e estimular a segurança para o uso de estratégias de enfrentamento (Brown, 2001; Golden, 1983). O brincar tem grande valor terapêutico, sendo importante, pois é um modo natural de expressão da criança, aumenta a auto-estima, prove a distração do medo e do stress, além de permitir que a criança exerça algum controle sobre seus sentimentos (Brown, 2001). Por meio do brincar, como mostra o trabalho
37 inédito de Patch Adams (1998)1, sentimentos são compartilhados, possibilitando que a criança os reconheça, aceite e expresse, enquanto outros são reduzidos, como a ansiedade e o stress. Atividades, como jogos, contar histórias, desenhos livres, pintura livre e de modelos prontos, que enfoquem situações de doença, manuais sobre a doença e a hospitalização, dramatização, fantoches, entre outras, são formas de intervenção psicológica junto a crianças hospitalizadas (Bersch, 2005; Golden, 1983; Brown, 2001; Matsunaga, 1996; Moore & Russ, 2006). Entre os tipos de brincadeiras propostas e recordadas para crianças hospitalizadas estão aquelas que representam a vida cotidiana, que propiciam a dramatização e a expressão artística. Além disso, o uso de objetos que fazem parte do cotidiano hospitalar, como luvas, seringas, máscaras e estetoscópio também favorecem a sensação de bem-estar no hospital, por permitir que a criança manipule esses materiais (Brown, 2001). Dentre essas estratégias que as crianças utilizam para enfrentar a hospitalização e amenizar os sintomas da doença, está a prática de jogos. Estes possibilitam modificar o cotidiano da internação e, por seu intermédio, a criança pode comunicar o que pensa e sente, suas preferências, receios e hábitos, sendo uma mediação entre o paciente e o mundo com situações novas ou ameaçadoras. Mesmo internadas e doentes, as crianças através dos jogos, têm a possibilidade de sair da posição passiva que a hospitalização impõe, para uma mais ativa, que possibilita a elaboração de experiências desconhecidas e desagradáveis, auxiliando a compreensão das limitações impostas pela doença.
1
Pach Adams- “O amor é contagioso”, de Tom Shadyac, Universal Pictures, 1998.
38 O jogo também pode funcionar como um facilitador entre os profissionais de saúde, o paciente e seu acompanhante, servindo como veículo de comunicação que utiliza uma linguagem mais acessível, também facilitando a adesão ao tratamento (Miltre & Gomes, 2004; Motta & Enumo, 2002; Vieira & Lima, 2002). Considerando a importância do brincar no contexto hospitalar, Motta e Enumo (2002, 2004a) elaboraram um instrumento avaliativo utilizado em crianças com câncer. Este instrumento foi informatizado e aplicado em 17 crianças também com câncer, facilitando o processo de registro, processamento e análise de dados (Motta, 2007; Soprani, Leal, Enumo & Menezes, 2005; Soprani, Leal, Enumo, Menezes & Motta, 2005). Esse uso de instrumentos informatizados em Psicologia tem sido discutido pelos profissionais da área (Joly, Martins, Abreu, Souza & Cozza, 2004; Prado, 2005), abordando questões apresentadas a seguir, particularmente no contexto hospitalar. 1.4 O uso de instrumentos informatizados para avaliação psicológica Os testes psicológicos surgiram no século XX, com o objetivo de avaliar aptidões humanas, inteligência, raciocínio, julgamento e reações afetivas e emocionais (Pasquali, 2001). Seu uso no contexto hospitalar ainda é muito limitado, porém pode favorecer a adesão e a motivação da criança (Joly et al., 2004; Prado, 2005). A avaliação de crianças hospitalizadas pode ser feita através da técnica da entrevista lúdica, que fornece indicadores da capacidade simbólica, sua tolerância à frustração, adequação à realidade e preferências lúdicas. Assim, a avaliação pretende detectar problemas no processo de desenvolvimento saudável, além de
39 fornecer orientações à família e à equipe médica. Também pode detectar problemas já existentes com o objetivo de minimizá-los, assim como, prevenir aqueles problemas que porventura possam emergir de sua condição de hospitalização (Crepaldi et al., 2006). Para a pesquisa científica, o teste é um instrumento que permite avaliar os participantes de forma estruturada e similar, propiciando assim, melhor fidedignidade dos dados, que são obtidos de forma padronizada, sem a interferência do examinador, permitindo que a aplicação do mesmo seja semelhante para todos os avaliados, além de os dados serem mais objetivamente analisados e com maior precisão, o que resulta numa verificação mais exata das hipóteses científicas (Joly et al., 2004, 2005; Pasquali, 2001). Entretanto, o trabalho do pesquisador sempre foi muito grande para preparar, aplicar, organizar, e cadastrar as informações coletadas nos testes. Ao propor uma avaliação mais específica, ele necessita preparar o material, organizá-lo e mantê-lo para a aplicação em diversos indivíduos. As informações coletadas são registradas manualmente em formulários e normalmente são utilizados recursos auxiliares, como câmeras e gravadores, para o registro de toda a aplicação. A transcrição dos dados geralmente ocorre em planilhas no computador, mas, no geral não há uma base única na qual os dados são armazenados. Devido a tantas variáveis a serem controladas, e além do tempo gasto, a observação e a obtenção dos dados podem ficar comprometidas (Enumo, 2005; Soprani, Leal, Enumo & Menezes, 2005). Dessa forma, a área da Informática pode contribuir nesse processo, pois o computador tem uma série de fatores que o tornam um grande facilitador da
40 interação pesquisador-pesquisado, pelo potencial motivador e interativo. As primeiras experiências com testes informatizados surgiram a partir de 1930, e objetivavam facilitar a correção e permitir menos interferência do examinador nos resultados. Contudo, a partir de 1980, houve um grande desenvolvimento das versões informatizadas de teste antes realizados com lápis e papel (Joly et al., 2004, 2005). O computador proporciona algumas vantagens, entre elas, uma apresentação do teste com maior clareza e qualidade. Além disso, possibilita uma interação mais produtiva, criativa e eficiente, facilita a comunicação e o acesso às informações produzidas pela capacidade de sintetizá-las e interpretá-las. A entrada do computador no contexto da avaliação psicológica pode contribuir para reduzir e facilitar o trabalho de coleta dos dados, organizar o processo de aplicação do instrumento e de avaliação, permitir a manutenção de uma base única das informações, além de ser atrativa e motivar a participação das crianças (Enumo, 2005; Joly et al., 2004, 2005; Soprani, Leal, Enumo & Menezes, 2005; Soprani, Leal, Enumo, Menezes & Motta, 2005; Pasquali, 2001). No Brasil, entretanto, há pouca utilização de testes informatizados, sendo assim, há pouca informação sobre esses instrumentos e essa modalidade de avaliação, assim como carência de estudos científicos (Joly et al., 2004, 2005). Dessa forma, o instrumento AEH – Avaliação do enfrentamento da hospitalização, proposto por Motta e Enumo (2002, 2004a, 2004b) originalmente em versão impressa, foi informatizado, proporcionando ganhos, como: maior agilidade na aplicação, redução de variáveis e recursos a serem controlados durante a aplicação, melhor acompanhamento do desenvolvimento das crianças, motivação
41 na participação do teste, beneficiando aqueles que precisam de apoio profissional para superar suas dificuldades (Soprani, Leal, Enumo & Menezes, 2005). 1.5 Justificativas Considerando o pequeno número de pesquisadores que se dedicam ao estudo das estratégias de enfrentamento em crianças e a carência de instrumentos voltados para essa faixa etária em condição de stress, segundo avaliação de Antoniazzi et al. (1998), Motta e Enumo (2002, 2004a, 2004b, 2005a) desenvolveram uma proposta de avaliação do enfrentamento da hospitalização em crianças com câncer, que resultou no instrumento AEH - Avaliação do enfrentamento da hospitalização. Este continha 45 pranchas de 17x21 cm, com desenhos em preto-e-branco, sendo organizado em dois conjuntos – AEH Avaliação do enfrentamento da hospitalização, e ABH – Avaliação do brincar no hospital. O AEH permite identificar não só as estratégias mais freqüentes de enfrentamento da hospitalização, mas também as variáveis a elas relacionadas, as quais podem estar vinculadas ao contexto ambiental (hospital, escola, família e rede de apoio) e da própria criança (crenças e regras). Na versão original, o AEH foi aplicado em 28 crianças entre 6 e 12 anos de idade, no ano 2000. Mostrou-se adequado e permitiu identificar a presença de comportamentos mais facilitadores (brincar, conversar, buscar informações) do que não-facilitadores (chorar, ficar triste, sentir medo) (Motta & Enumo, 2005b; Motta, Enumo & Ferrão, 2006). Sua aplicação fornece dados para intervenções psicológicas que possibilitem à criança expressar suas emoções e mudar seus comportamentos frente à hospitalização, ao tratamento e à doença. Proporciona, assim, uma maior adaptação aos
42 mesmos, procurando prevenir possíveis danos cognitivos e emocionais para as crianças hospitalizadas. Contudo, na medida em que esse instrumento foi aplicado a uma população específica (crianças com câncer), não se conhece sua adequação a outros tipos de doenças infantis que levam à internação hospitalar, como Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), anemia falciforme, doenças respiratórias, distrofia muscular, pacientes da ortopedia, entre outras patologias. Da mesma forma, na aplicação inicial, o AEH tinha formato impresso, tendo sido alterado quanto à forma, e posteriormente, desenvolvido na versão computadorizada. Em 2005, essa nova versão foi aplicada em 17 crianças, as quais também tinham câncer, de forma que há somente uma experiência preliminar de aplicação nesse novo formato (Motta, 2007; Motta & Enumo, 2005b; Soprani, Leal, Enumo, Menezes & Motta, 2005). Assim, levando em conta que esse é um instrumento novo, sem aplicação em larga escala, parece relevante analisar se as estratégias de enfrentamento da hospitalização têm alguma relação com o padrão comportamental da criança anterior à internação. Seria uma forma de melhor relacionar o contexto da hospitalização como desencadeador de certas estratégias de enfrentamento. Para tanto, pretende-se utilizar a Lista de Verificação Comportamental para Crianças CBCL - Child Behavior Checklist (6-18 anos) (Achenbach & Edelbrock, 1991), que é uma escala bastante utilizada em pesquisas internacionais, com uma primeira validação no país feita por Bordin, Mari e Caeiro (1995), havendo outros estudos nacionais (Melo & Silvares, 2003; Rocha & Silvares, 2006; Silvares, Meyer, Santos & Gerencer, 2006).
43 Assim, diante da escassez de pesquisas sobre enfrentamento em crianças no país e da relevância científica e social de se conhecer as estratégias utilizadas por crianças na hospitalização, e também considerando os aspectos positivos trazidos pelo brincar no contexto hospitalar, é que foi proposta esta pesquisa voltada para a identificação das estratégias de enfrentamento da hospitalização, a partir do relato da criança. Espera-se, desse modo, fornecer subsídios a futuras intervenções psicossociais necessárias ao tratamento adequado da criança hospitalizada. 1.6 Objetivos Esta pesquisa visa identificar, descrever e analisar as estratégias de enfrentamento da hospitalização por crianças hospitalizadas por doenças diversas, exceto o câncer, por meio de instrumento informatizado, que também identifica
atividades
lúdicas
de
interesse
no
contexto
hospitalar.
Mais
especificamente, pretendeu-se: 1) identificar, descrever e analisar os comportamentos facilitadores e nãofacilitadores do enfrentamento da hospitalização dessas crianças; 2) identificar, descrever e analisar as estratégias de enfrentamento (categorias de coping) da hospitalização, presentes nos relatos das crianças sobre como lidam com a situação de hospitalização; 3) identificar possíveis problemas de comportamento prévios à hospitalização e verificar suas relações com as estratégias de enfrentamento utilizadas pelas crianças hospitalizadas; 4) identificar possíveis alterações na rotina da criança decorrentes da hospitalização e suas relações com as estratégias de enfrentamento;
44 5) identificar e analisar possíveis relações entre variáveis da criança e da hospitalização, como o número e tempo de internação, tipo de patologia, idade e escolaridade da criança; 5) caracterizar as atividades lúdicas possíveis na situação hospitalar, de interesse das crianças hospitalizadas; 6) avaliar o uso de um instrumento informatizado de avaliação das estratégias de enfrentamento da hospitalização; e 7) avaliar o uso de um instrumento informatizado de avaliação do brincar no contexto hospitalar.
45
2 MÉTODO 2.1 Participantes e Local de Coleta de Dados Participaram desta pesquisa 28 crianças (20 meninos e 8 meninas), com idades entre 6 e 12 anos (média de 9 anos e 5 meses), internadas nas Enfermarias de Infectologia (12 crianças, 42,9%), Cirurgia Geral (11 crianças, 39,2%) e Ortopédica (5 crianças, 17,9%) do Hospital Infantil de Vila Velha “Dr. Alzir Bernardino Alves” (HIABA), em Vila Velha, ES, vinculado ao Sistema Único de Saúde da Região Metropolitana da Grande Vitória. Os responsáveis pelas crianças (25 mães, 89,3%) também atuaram como informantes, assim como a Gerente Sócio-terapêutica do HIABA2. 2.1.1 Critérios para seleção da amostra A inclusão dos participantes nesta amostra de conveniência seguiu os seguintes critérios: (a) a criança estar internada no HIABA por 5 dias consecutivos ou mais, tempo este de exposição ao ambiente hospitalar que pode levar ao desenvolvimento de problemas psicológicos ou de comportamento, segundo Dias et al. (2003); (b) a criança ter entre 6 e 12 anos de idade, considerando que, aos 6 anos, a criança já deve ter compreensão e linguagem suficientes para responder a entrevistas; (c) a criança apresentar qualquer doença, exceto algum tipo de câncer, para se diferenciar de estudo anterior com essa população e que utilizou os
2
Agradecemos à Gerente Sócio-Terapeuta – Melissa Santos de Oliveira – pela colaboração no fornecimento das informações sobre o HIABA.
46 mesmos instrumentos de coleta de dados (Motta, 2001, 2007; Motta & Enumo, 2002, 2004a, 2004b; Motta et al., 2006); (d) os responsáveis pela criança autorizarem a participação na pesquisa (APÊNDICE A - Termo de consentimento para a participação em projeto de pesquisa). A coleta de dados durou 6 meses - janeiro a junho de 2006 -, período este em que 56 crianças preencheram os critérios de inclusão na amostra; mas, somente 28 (50%) delas compuseram a amostra final. A exclusão de 28 crianças decorreu de: (a) ausência dos pais no momento do contato (20), o que impediu a coleta de dados; e (b) problemas de áudio nas fitas de gravação (8), impossibilitando o processamento dos dados das justificativas das crianças. 2.2. Local de coleta de dados O HIABA é um hospital público da rede estadual do ES e recebe pacientes de baixa renda, provenientes de todas as regiões do Espírito Santo, sul da Bahia e leste de Minas Gerais. Foi fundado em 2002 e, desde então, mais de 300 mil crianças foram atendidas. O hospital contava, na época da coleta dos dados, com uma equipe formada por 154 médicos (102 efetivos e 52 cooperados), 25 profissionais da área de enfermagem (enfermeiros, técnicos de enfermagem e auxiliares de enfermagem), 5 assistentes sociais, 5 fisioterapeutas, 1 nutricionista, 1 psicóloga e 1 fonoaudióloga. Além disso, possuia os seguintes serviços: Pronto-socorro, Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal, UTI pediátrica, Cirurgia de urgência, emergência e eletiva (geral, cirurgia geral, cirurgia ortopédica, pneumologia, infectologia, gastroenterologia e plástica), Ambulatório de especialidades
47 (pneumologia, fibrose cística, gastroenterologia, hematologia, otorrinolaringologia, cirurgia plástica, ortopedia, cirurgia geral, acompanhamento de crianças de baixo peso - Follow up), Laboratório de análises clínicas, Agência transfusional, Radiologia,
Serviço de diagnóstico (eletroencefalograma, ultrassonografia,
endoscopia digestiva, eco-doppler), Banco de leite humano e Sala de recreação, com brinquedoteca. Ao todo, o hospital possui 91 leitos, sendo 13 no Prontosocorro, 13 na UTI neonatal, 3 na UTI pediátrica e 12 leitos para médio risco e baixo risco de UTI, 52 nas enfermarias e 2 semi-intensivos para enfermaria. Segundo dados fornecidos pela Gerente Sócio-Terapeuta, o Hospital atendia cerca de 7.000 crianças/mês, sendo o Pronto-Socorro responsável por cerca de 5.000 atendimentos mensais. Na UTI, ficavam internadas 34 crianças/mês. No Centro Cirúrgico, eram realizadas em torno de 140 cirurgias/mês. O Centro de Diagnóstico atendia cerca de 630 crianças/mês. Nas enfermarias, ficavam internadas 170 crianças/mês, sendo as doenças infecciosas, pulmonares, gástricas e os acidentes os tipos de patologias mais atendidos. O tempo médio de internação nas enfermarias era de sete dias. A sala de recreação tinha aproximadamente 35m2, possuindo 4 mesas de plástico infantis com 16 cadeiras de plástico infantis, além disso, possuia uma televisão de 29” com videocassete, algumas fitas de vídeo de desenhos, brinquedos diversos, jogos, livros de histórias e um balanço infantil para duas crianças. As atividades recreativas no Hospital não eram realizadas de forma sistemática e organizada, por falta de um profissional capacitado para desempenhar essa função. Assim, a sala de recreação era usada quando um enfermeiro abria a sala por algumas horas no dia e permitia que as crianças
48 entrassem e brincassem. Essas atividades eram livres e não tinham o objetivo de promover um apoio psicossocial. O hospital não tinha classe hospitalar, de forma que, em casos de internações prolongadas, as crianças não tinham a oportunidade de continuar os estudos nesse período. Os dados foram coletados na brinquedoteca do HIABA, nos períodos em que estava disponível e a criança podia se locomover até esse local. Quando a criança estava imobilizada no leito, a coleta foi feita dentro da enfermaria na qual a criança se encontrava. Uma enfermaria comum continha 3 leitos, 3 cadeiras para os acompanhantes, 3 armários e 3 suportes para refeições, sendo freqüentada por 2 pessoas durante a coleta de dados, que foi conduzida pela pesquisadora3, com auxílio de 3 alunas de Iniciação Científica, com bolsas do CNPq4. A coleta dos dados com a criança e com os pais era feita concomitantemente, sendo que os pais foram entrevistados na enfermaria, na sala da assistente social, que continha duas cadeiras e uma mesa ou no pátio da instituição, onde havia apenas bancos para sentar, por uma das bolsistas de PIBIC/CNPq. 2.3 Instrumentos e Materiais Foram utilizados, na coleta de dados, os seguintes instrumentos: 1) Ficha de Identificação da Criança: contém informações sobre o histórico da doença e do tratamento, como o tempo de internação, patologia, quantas internações a criança já teve, existência ou não de complicações no tratamento, e dados sobre a vida familiar da criança, tais como, configuração familiar, quem 3
A pesquisadora tem formação em Psicologia pela UFES (2002). Agradecemos as alunas de graduação em Psicologia da UFES, bolsista de PIBIC/CNPq - Cibele Marques Coelho de Medeiros Cazelli, Kelly Ambrósio Silveira e Charlene Zanoni Vieira - pelo auxílio na coleta e processamento dos dados. 4
49 cuida da criança em casa e quem está com os outros filhos (quando houver outros) durante a internação da criança (APÊNDICE B - Ficha de Identificação da Criança). Essas informações estavam registradas em prontuários arquivados no posto de enfermagem do HIABA; 2) Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança (PCRC) - Este formulário contém 42 questões abertas e fechadas a serem respondidas pelos responsáveis da criança. Na primeira parte, há 10 perguntas sobre a identificação da criança e 3 perguntas sobre sua patologia. A segunda parte é composta de 5 perguntas sobre o tempo que a criança passava com amigos e parentes e quais atividades desenvolvia com eles antes da internação. A terceira parte é composta de 14 perguntas abertas sobre a rotina da criança em casa, antes da hospitalização, caracterizando um dia da semana e um dia de final de semana, definindo o que ela fazia nos períodos da manhã, tarde e noite. A quarta parte é composta de 7 perguntas sobre a rotina da criança no hospital, o qual fornece dados que permitem caracterizar um dia da criança nesse ambiente. Na quinta e última parte, o responsável é solicitado a responder 5 perguntas sobre o quanto a hospitalização alterou a vida diária, classificando numa escala de 4 pontos (1 a 4), e o quê mudou na rotina (APÊNDICE C - Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança); 3) Lista de Verificação Comportamental para Criança (Child Behavior Checklist – CBCL - 6-18 anos) (Achenbach & Edelbrock, 1991; Achenbach & Rescorla, 2004; Melo & Silvares, 2003; Rocha & Silvares, 2006; Silvares et al., 2006) - é uma escala de comportamentos aplicada nos pais ou responsáveis, avaliando aspectos relativos à competência social, depressão e isolamento, agressividade e
50 comportamento anti-social, de forma a fornecer um índice de distúrbio total em crianças e adolescentes de 6 a 18 anos. Contém 138 itens: 20 relacionados à avaliação da Competência Social da criança ou do adolescente e 118 relacionados à avaliação dos Problemas de Comportamento (Bordin et al., 1995). A escala de Competência Social refere-se ao envolvimento em atividades (jogos, esportes, passatempos etc.), participação em grupos, relacionamento com pessoas, independência ao realizar uma atividade e desempenho escolar. Na escala de Competência Social, os pais devem comparar seus filhos com crianças da mesma idade e o quão bem desenvolvem essas atividades; na escala de Problemas de Comportamento, os pais devem levar em consideração os últimos seis meses de vida da criança. Nesta escala de Problemas de Comportamento, são identificadas como escalas de Síndromes, subdivididas em oito subescalas: ansiedade/depressão, isolamento/depressão, queixas somáticas, problemas sociais, problemas de pensamento, problemas de atenção, comportamento transgressor e comportamento agressivo. A classificação da resposta é feita considerando a freqüência do comportamento, numa escala de 3 pontos, envolvendo três variáveis: item falso ou comportamento ausente; item parcialmente verdadeiro ou comportamento às vezes presente; item bastante verdadeiro ou comportamento frequentemente presente. O CBCL é processado através do software Assessment Data Manager 6.5 (ADM). Embora o protocolo utilizado nesta pesquisa seja de 1991, o software transforma os resultados para a versão de 2001. Esta versão mais nova também classifica os dados do CBCL segundo as escalas do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 4ª Ed. (DSM-IV).
51 4)
Instrumento
Informatizado
para
Avaliação
do
Enfrentamento
da
Hospitalização – AEHcomp (Leal, 2005; Motta, 2007; Soprani, 2005; Soprani et al., 2005; Soprani, Leal, Enumo, Menezes & Motta, 2005) – composto por um software com 20 cenas coloridas, desenhadas, sobre temas que retratam possíveis estratégias de enfrentamento da hospitalização, para identificar o que as crianças relatam e sentem sobre sua condição de hospitalização, permitindo avaliar suas estratégias de enfrentamento, segundo proposta originalmente feita na versão em papel, por Motta e colaboradores (Motta & Enumo, 2002, 2004b; Motta et al., 2006). Este conjunto foi elaborado com base em instrumentos avaliativos de stress, ansiedade infantil e de coping, e em registros de observação do comportamento infantil durante a hospitalização (Motta & Enumo, 2004b). As cenas são classificadas em duas categorias de respostas: (a) 10 comportamentos facilitadores da hospitalização (respostas adaptativas à situação de hospitalização – assistir TV, brincar, cantar, ouvir música, rezar, estudar, ler gibi, buscar informações, conversar e tomar remédio); e (b) 10 comportamentos nãofacilitadores (respostas não-adaptativas à situação – sentir raiva, chorar, sentir-se triste, desanimar, sentir medo, fazer chantagem, pensar em esconder, pensar em milagre, pensar em fugir e sentir culpa) Há uma versão para meninos em que o personagem principal é do sexo masculino, e outra para menina, em que o personagem principal é do sexo feminino (vide APÊNDICE D - Exemplos de Cenas do AEHcomp na Versão Menino, e APÊNDICE E - Exemplos de Cenas do AEHcomp na Versão Menina, para exemplos de cenas de comportamentos facilitadores e não-facilitadores, respectivamente). A aplicação do instrumento dura, em média, 15 minutos e consiste na apresentação à criança de uma cena
52 por vez. Na pesquisa de Motta (2007), o tempo médio de aplicação foi de 25 minutos. Para registrar a resposta, são apresentadas à criança 5 opções, em escala tipo likert: nunca; um pouco; às vezes; quase sempre ou sempre. Após a escolha de cada figura, a criança é questionada sobre o motivo de sua resposta, que é gravada e posteriormente transcrita para uma folha de registro (APÊNDICE F - Folha de registro das respostas ao Instrumento Informatizado de Avaliação do Enfrentamento da Hospitalização – AEHcomp). Por segurança, as aplicações também foram também registradas em áudio. O AEHcomp e o Instrumento Informatizado para Avaliação do Brincar no Hospital (ABHcomp), descrito a seguir, foram implementados num software livre, denominado Ambiente Computacional para Apoio a Avaliações Psicológicas (ACAAPSI), que utiliza ferramentas livres Apache (servidor Web), PHP (linguagem de programação) e MySql (servidor de banco de dados). Este software é composto de dois módulos: (a) o módulo de Autoria provê a criação de testes para a avaliação, composição dos itens a serem avaliados e sua pontuação, e (b) o módulo Avaliador, que fornece o apoio à avaliação. O primeiro módulo é um Sistema de Autoria (Soprani, 2005), que permite a criação de testes psicológicos para execução e coleta de dados; é um gerador de testes para a coleta dos dados. Este sistema permite que o avaliador (psicólogo) crie ou edite os seus testes para a avaliação, executando os testes gerados. Suas principais funções são: manter a base com objetos para geração dos testes (textos, imagens e sons); criar/ editar testes; definir as avaliações a serem efetuadas pelo teste criado; e aplicar o teste. Neste módulo, todas as informações
53 concernentes à elaboração e gerenciamento do teste são feitas (APÊNDICE G Módulo de Autoria do ACAAPSI ). O segundo módulo é um Sistema Avaliador (Leal, 2005), que, a partir dos dados obtidos com a aplicação de teste ou prova psicológica e outras informações inseridas pelo agente avaliador (psicólogo), apóia o processo de avaliação psicológica, fornecendo a possibilidade de uma categorização dos resultados, o suporte a estudos estatísticos, à composição de diagnósticos e possibilita consultas à base gerada. Permite, assim, que as informações coletadas e inseridas sejam analisadas. Suas principais funções são: oferecer suporte para registro de informações e contextos relativos ao avaliado, e à classificação e análise dos itens avaliados; extrair dados em arquivo; consultar os resultados; e oferecer suporte à composição de diagnóstico. Neste módulo, o avaliador pode inserir todas as informações sobre o avaliado, como, por exemplo, dados pessoais, familiares, sociais e médicos. Além disso, o módulo permite a escolha dos testes a serem aplicados nos avaliados e, posteriormente, realizar a classificação das respostas dadas às questões dos testes (APÊNDICE H - Módulo Avaliador do ACAAPSI). Nesta pesquisa, o módulo Avaliador não foi usado de modo integral, pois o ACAAPSI estava em fase final de adequação de suas possibilidades de uso. 5) Instrumento Informatizado para Avaliação do Brincar no Hospital ABHcomp (Leal, 2005; Motta, 2007; Soprani, 2005; Soprani et al., 2005; Soprani, Leal, Enumo, Menezes & Motta, 2005) – é composto por um software com cenas apresentando 20 tipos de brincadeiras desenhadas e coloridas, aplicadas individualmente em crianças, para identificar a importância que as mesmas dão
54 ao brincar e a possibilidade de que atividades lúdicas contribuam para o enfrentamento adequado da hospitalização. Para este conjunto, originalmente feito em versão no papel por Motta e colaboradores (Motta & Enumo, 2002, 2004a; Motta et al., 2006), foi utilizado o sistema de classificação por grupo de brinquedos ESAR (Garon, 1996), cuja base psicológica ressalta a importância de conhecimentos
sobre
o
desenvolvimento
infantil
(Fonseca,
2003).
Foi
acrescentada uma categoria, com Atividades Recreativas Diversas (AD), que não puderam ser classificadas por esse sistema. Assim, este sistema adotado contempla 5 tipos de atividades lúdicas, com 4 atividades cada um: (a) jogos de exercício (E) - jogar bola e tocar instrumentos; (b) jogos simbólicos (S) – fantoches, palhaço, desenhar e brincar de médico; (c) jogos de acoplagem (A) – montagem, modelagem, quebra-cabeça, e recortar e colar; (d) jogos de regras (R) – dominó, jogar baralho, minigame, bingo e boliche; e (e) atividades recreativas diversas (AD) - assistir TV, ler gibi, ouvir história, jogo das pedrinhas e ouvir música. Há uma versão para meninos e outra para meninas (APÊNDICE I Exemplos de Cenas do ABHcomp na Versão Menino e APÊNDICE J - Exemplos de Cenas do ABHcomp na Versão Menina). Para a aplicação do ABHcomp, primeiramente, apresenta-se a cena, pedindo à criança que escolha uma de 5 opções, em escala tipo likert: nunca; um pouco; às vezes; quase sempre ou sempre. Após a escolha de cada figura, a criança é questionada sobre o motivo de sua resposta, cujo relato que é gravado e, posteriormente, transcrito para uma folha de registro. A aplicação tem a duração média de 12 minutos (APÊNDICE K Folha de registro das respostas ao Instrumento Informatizado de Avaliação do
55 Brincar no Hospital – ABHcomp). Por segurança, as aplicações também foram também registradas em áudio. Foram utilizados também os seguintes materiais e equipamentos: gravador de áudio, fitas cassete, filmadora manual, fitas de vídeo, notebook Athlon XP-M 2,8, 1024 de RAM, HD de 40Gb, onde foram instaladas as ferramentas para implementação e suporte do software: Apache, MySql e PHP, criado o banco e instalado o ACAAPSI; papel e caneta, para anotações das informações relevantes. 2.4 Procedimento Procurando alcançar os objetivos desta pesquisa – identificar, descrever e analisar as estratégias de enfrentamento da hospitalização por crianças hospitalizadas por doenças diversas, por meio de instrumento informatizado, que também identifica atividades lúdicas de interesse no contexto hospitalar – foram executadas as seguintes etapas: Etapa 1: Identificação e caracterização dos participantes O primeiro passo foi a identificação dos participantes a partir de visita às enfermarias do hospital para obtenção dos dados que preenchessem os critérios de seleção da amostra, uma vez que, no leito das crianças, havia uma identificação com o nome, idade, tempo de internação e patologia, sendo assim possível fazer uma triagem dentre as crianças internadas. Após essa visita, seguia-se com o segundo passo, que compreendia o contato com a criança e seu responsável para explicar sobre a pesquisa e verificar o interesse da criança em participar da mesma, e, em caso afirmativo, seguia-se com a leitura e assinatura do termo de consentimento.
56 O terceiro passo abrangia o levantamento documental dos prontuários médicos e fichas de dados sociais das crianças, feito nas enfermarias, em dias e horários que não prejudicasse a rotina do hospital. Esse trabalho foi completado com perguntas diretas feitas ao acompanhante da criança na segunda etapa da pesquisa. O quarto passo incluiu uma entrevista com a Gerente Sócio-terapeuta do hospital, para caracterização geral do local da coleta de dados. Durante a coleta de dados (janeiro a junho de 2006), foram identificadas 56 crianças, sendo que 28 compuseram a amostra final, conforme explicação anterior. Etapa 2: Entrevistas e aplicações do CBCL nas mães ou responsáveis Nesta etapa, as mães e/ou responsáveis assinaram o termo de consentimento de participação da criança na pesquisa e responderam a uma entrevista sobre a criança e um formulário sobre a rotina da criança, além do instrumento para avaliação comportamental da criança (CBCL), a fim de identificar possíveis problemas de comportamentos pré-existentes à internação hospitalar. Etapa 3: Entrevistas e aplicação dos instrumentos nas crianças Esta etapa foi dividida em duas partes. Num primeiro momento, houve a aplicação das provas para a investigação das estratégias de enfrentamento da hospitalização pelo AEHcomp, com a duração de 15 minutos e, posteriormente, a aplicação das provas para a investigação do brincar no hospital pelo ABHcomp, com a duração de 12 minutos, ambas em aplicação individualizada, gravada em áudio, na Enfermaria e na Brinquedoteca.
57 2.5 Processamento e análise de dados O processamento e a análise dos dados foram feitos de acordo com cada instrumento, sendo descritos separadamente, a seguir. 2.5.1. Processamento e análise descritiva dos dados Os dados de cada instrumento foram processados e analisados de forma que fornecessem
dados
individualizados
e
descritivos
concernentes
a
cada
instrumento. 2.5.1.1. Processamento e análise dos dados obtidos com o Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança Foram processados nesta pesquisa somente os dados obtidos pela última parte do protocolo, na qual a mãe e/ou responsável é solicitada a avaliar o quanto a hospitalização afetou a rotina da criança, pois nessa parte eram fornecidas a avaliação do acompanhante sobre os dados a serem analisados. A primeira pergunta classifica a resposta em sim ou não quando é requerido ao entrevistado que avalie se a hospitalização alterou a rotina da criança. A segunda pergunta classifica numa escala de 1 a 4 o quanto a hospitalização alterou a rotina da criança. Na terceira pergunta, o entrevistado é solicitado a falar o que mudou na rotina de seu filho (APÊNDICE L - Processamento e análise dos dados obtidos com o Protocolo de Caracterização da Rotina da Criança). A classificação das respostas a essa pergunta foi feita da seguinte forma: a) “mudança no social”, que inclui as respostas referentes a não brincar mais, não ver amigos e/ou parentes, não freqüentar a escola e a igreja;
58 b) “mudança na rotina”, que inclui as respostas referentes às mudanças na alimentação, no sono, mudança nos horários e permanecer deitado e apático. As demais informações do protocolo foram utilizadas na composição dos Estudos de Caso, apresentados nos Resultados. 2.5.1.2. Processamento e análise dos dados obtidos com a Lista de Verificação Comportamental para Criança (CBCL) O processamento dos dados do Child Behavior Checklist (6-18 anos) (Achenbach & Rescorla, 2004) foi feito através do software Assessment Data Manager 6.5 (ADM)5. Este software abrange módulos para digitar e analisar os dados obtidos com os
questionários
do
ASEBA
(Achenbach
System of
Empirically
Based
Assessment), o qual inclui o Child Behavior Checklist (CBCL). A interface do programa é de fácil utilização, exigindo domínio de língua inglesa. Dentre as muitas opções que o software oferece, algumas delas são: comparar facilmente os dados entre diversos informantes em diferentes questionários sobre o mesmo cliente, optar pela escala orientada pelo DSM-IV, e converter os dados de versões antigas para as atuais. Os dados são inseridos no software por meio da atribuição de valores dados às respostas fornecidas pelo informante. Após inserir os dados, é necessário repetir esta operação, para que o próprio software verifique se os dados foram inseridos corretamente (Achenbach & Rescorla, 2004).
5
Os dados do CBCL foram processados no Laboratório de Terapia Comportamental do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, sob a responsabilidade da Profa. Dra. Edwiges F. M. Silvares, com auxílio da Dra. Márcia H. S. Melo e sua aluna Marina Monzani, a quem agradecemos pelo curso e pelo espaço para o processamento das informações.
59 A classificação das respostas envolve três variáveis: item falso ou comportamento ausente (escore = 0); item parcialmente verdadeiro ou comportamento às vezes presente (escore = 1); item bastante verdadeiro ou comportamento frequentemente presente (escore = 2). A pontuação bruta alcançada em cada uma das escalas é convertida em Escores T. Na escala total de Competência Social, o escore T varia de 10 a 80, sendo que o ponto de corte para a classificação “clínica” compreende escores T