Incapaz de se mover para apanhar suas compras, Ana se aprumava pálida. Uma
expressão de rosto, há muito não usada, ressurgira-lhe com dificuldade, ainda incerta incompreensível. O moleque dos jornais ria carregando-lhe o volume. Mas os ovos haviam quebrado no embrulho de jornal. Gemas amarelas e viscosas pingavam entre os fios da rede. O cego interrompera a mastigação e avançava as mãos inseguras.
tentando inutilmente pegar o que acontecia. O embrulho dos ovos foi jogado fora da rede e, entre os sorrisos dos passageiros e o sinal do condutor, o bonde deu a nova arrancada de partida. Poucos instantes depois já não a olhavam mais. O bonde se sacudia nos trilhos e o cego mascando goma ficara atrás para sempre. Mas o mal está feito. A rede de tricô era áspera entre os dedos, não íntima como quando a tricotara. A rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido; não sabia o que fazer com as compras no colo. E como uma estranha música, o mundo recomeçava ao redor. O mal estava feito. (Clarice Lispector. "Amor". In: Laços de família. Rio de Janeiro: Rocco, 2009, p. 22.)

O que simboliza em amor a quebra dos ovos que passa incomodar Ana
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