A fé que move montanhas, como nos acostumamos a ouvir, será capaz de enfrentar o isolamento social?
Provavelmente sim, mas não sem passar por uma série de transformações trazidas pela virtualização do sagrado.
Com a impossibilidade de encontros sociais e aglomerações, muitos religiosos recorreram a redes sociais e canais de streaming para exibir cultos, encontros, cerimônias e formações. Hoje com alguns estados já liberando a reabertura dos templos e igrejas, muitas casas ainda mantêm as atividades presenciais suspensas — seja pela dificuldade de cumprir com todas as regras dos protocolos de funcionamento, ou por entenderem que ainda há risco à saúde dos fiéis. E o universo virtual, que antes era uma necessidade, deve se tornar, para alguns, prática fixa.
Todas as terças-feiras, à noite, pai Elias Cagnoni realiza trabalhos espirituais no templo de umbanda Aldeia da Mata, em São Paulo, exibidos pela internet. As cerimônias —que antes reuniam no terreiro, de segunda a sexta-feira, dezenas de pessoas em busca de atendimento— hoje acontecem exclusivamente a distância. A cada semana, uma entidade ou orixá é tema do encontro, com reflexão, oração e cânticos.
Essas transmissões online começaram em março, logo quando o governo de São Paulo suspendeu as atividades de igrejas e templos religiosos no estado, como medida de prevenção ao coronavírus. A princípio usando o Instagram e o Facebook como canais, no início de junho, as lives passaram para o YouTube, em uma estrutura técnica melhorada, com ajuda de voluntários da própria casa.
O processo de virtualização pegou de surpresa o dirigente da Aldeia da Mata, que, segundo ele, nem era assim tão familiarizado com tecnologia, e refletiu diretamente nos rituais, principalmente aqueles com contato físico. "A gente vai tomar um passe, se aproxima do médium. Se ele vai usar cachimbo para te benzer, ou erva, a gente tem proximidade. Também há giras em que a gente dança. Ou seja, como em várias religiões, a gente tem as práticas físicas e presenciais", explica Cagnoni.
É possível receber o axé a distância? Segundo o pai de santo, sim. Por isso, a orientação do terreiro é para que as pessoas que forem ver as lives vistam-se de branco, usem suas guias e acendam uma vela, formas de cultuar os orixás. "Ontem mesmo, nossa gira online foi na falange de linha médica (entidades de cura espiritual e física), e logo após teve um testemunho de uma moça que se sentiu operada", conta o pai de santo.
Na opinião dele, não tem como fugir da assimilação da internet ao dia a dia da Aldeia da Mata, daqui pra frente, sem substituir totalmente, claro, a relação presencial. A ferramenta possibilitou aproximar o terreiro de mais pessoas, inclusive gente que vive em outros estados e países, e que estão acompanhando as giras, e ajuda também a popularizar os rituais da religião, desconstruindo preconceitos.
"Veio para a gente dar um passo à frente", afirma. "Se podem usar a tecnologia para soltar um míssil que vai destruir uma cidade, porque não se pode usar a tecnologia para um ato de fé, amor, oferecer algo de bom para as pessoas?"
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maliaass72
Muito obrigada pela resposta, mas poderia por favor resumir por favor
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A fé que move montanhas, como nos acostumamos a ouvir, será capaz de enfrentar o isolamento social?
Provavelmente sim, mas não sem passar por uma série de transformações trazidas pela virtualização do sagrado.
Com a impossibilidade de encontros sociais e aglomerações, muitos religiosos recorreram a redes sociais e canais de streaming para exibir cultos, encontros, cerimônias e formações. Hoje com alguns estados já liberando a reabertura dos templos e igrejas, muitas casas ainda mantêm as atividades presenciais suspensas — seja pela dificuldade de cumprir com todas as regras dos protocolos de funcionamento, ou por entenderem que ainda há risco à saúde dos fiéis. E o universo virtual, que antes era uma necessidade, deve se tornar, para alguns, prática fixa.
Todas as terças-feiras, à noite, pai Elias Cagnoni realiza trabalhos espirituais no templo de umbanda Aldeia da Mata, em São Paulo, exibidos pela internet. As cerimônias —que antes reuniam no terreiro, de segunda a sexta-feira, dezenas de pessoas em busca de atendimento— hoje acontecem exclusivamente a distância. A cada semana, uma entidade ou orixá é tema do encontro, com reflexão, oração e cânticos.
Essas transmissões online começaram em março, logo quando o governo de São Paulo suspendeu as atividades de igrejas e templos religiosos no estado, como medida de prevenção ao coronavírus. A princípio usando o Instagram e o Facebook como canais, no início de junho, as lives passaram para o YouTube, em uma estrutura técnica melhorada, com ajuda de voluntários da própria casa.
O processo de virtualização pegou de surpresa o dirigente da Aldeia da Mata, que, segundo ele, nem era assim tão familiarizado com tecnologia, e refletiu diretamente nos rituais, principalmente aqueles com contato físico. "A gente vai tomar um passe, se aproxima do médium. Se ele vai usar cachimbo para te benzer, ou erva, a gente tem proximidade. Também há giras em que a gente dança. Ou seja, como em várias religiões, a gente tem as práticas físicas e presenciais", explica Cagnoni.
É possível receber o axé a distância? Segundo o pai de santo, sim. Por isso, a orientação do terreiro é para que as pessoas que forem ver as lives vistam-se de branco, usem suas guias e acendam uma vela, formas de cultuar os orixás. "Ontem mesmo, nossa gira online foi na falange de linha médica (entidades de cura espiritual e física), e logo após teve um testemunho de uma moça que se sentiu operada", conta o pai de santo.
Na opinião dele, não tem como fugir da assimilação da internet ao dia a dia da Aldeia da Mata, daqui pra frente, sem substituir totalmente, claro, a relação presencial. A ferramenta possibilitou aproximar o terreiro de mais pessoas, inclusive gente que vive em outros estados e países, e que estão acompanhando as giras, e ajuda também a popularizar os rituais da religião, desconstruindo preconceitos.
"Veio para a gente dar um passo à frente", afirma. "Se podem usar a tecnologia para soltar um míssil que vai destruir uma cidade, porque não se pode usar a tecnologia para um ato de fé, amor, oferecer algo de bom para as pessoas?"