Alguem pode me ajudar com a interpretação de um poema do Jorge de Lima que se encontra no livro Poemas negros (1947) ? por favor. (2°geracao do modernismo).
obs: algumas caracteristicas dos seus poemas: sua poesia revela temas telúricos de origem popular e africana. Depois, na "fase religiosa", seus poemas apresentam traços de religiosidade.
->Exu Comeu Tarubá<-
O ar estava duro, gordo, oleoso:
a negra dentro da madorna;
e dentro da madorna - bruxas desenterradas.
No chão uma urupema com os cabelos da moça.
Foi então que Exu comeu tarubá
e meteu a figa na mixira de peixe-boi.
Aí na distância sem fim, moças foram roubadas,
e sóror Adelaide veio viajando de rede,
era alva ficou negra, era santa ficou lesa:
caiu na madorna, o ar duro, gordo, oleoso.
Exu começou a babar a mixira de peixe-boi,
o professor tirou o pincenê: estava traído pelo donatário,
sem barregãs, sem ginetes, sem escravos.
Aí na distância sem-fim, viajando de rede
D.Diogo de Holanda veio parar na madorna,
o ar duro, gordo, oleoso.
Exu começou a lamber a mixira de peixe-boi:
Isabel Lopo de Sampaio desvirginou o moleque,
Jogou-se no rio, virou ingazeira, pariu três macacos.
Viajando de rede vieram três macacos parar na madorna,
o ar duro, gordo, oleoso.
Eis aí três cirurgiões cosendo retrós,
a bela adormecida no século vindouro
que esquecerá por certo a magia
contra tudo que não for loucura
ou poesia.
Lista de comentários
Primeiramente devemos entender as palavras do Poema, para isso fiz uma pesquisa. Vou interpretar linha a linha adquirindo o significado das palavras que desconheço.
->Exu Comeu Tarubá<-
O ar estava duro, gordo, oleoso:
Significa que estava pesado, é um termo usado em religiões espiritualistas que representa a presença de "entidades espirituais" de classe mais próxima a matéria. Garantindo uma sensação de "peso" ao ambiente.
a negra dentro da madorna;
Madorna segundo o que pesquisei é um estado de sonolência (usada no Alagoas), quase que um transe. Transe é um processo pelos quais pessoas que se comunicam com espíritos passam antes de serem "possuídas" por determinada entidade. Provavelmente indica uma mulher negra em estado de transe
e dentro da madorna - bruxas desenterradas.
Acredito que não se refira a Bruxas não apenas como pessoa e sim como um objeto, uma panela de barro onde se faz braseiro. O autor se aproveitou da dupla significância do termo bruxas para fazer referência a espiritualidade. Onde bruxa é a pessoa que mantém contato com entidades espirituais, logo simbolizando a comunicação com o mundo espiritual.
No chão uma urupema com os cabelos da moça.
Urupema é uma espécie de peneira fina. Parece uma forma de fazer uma oferenda, para se comunicar com uma entidade.
Foi então que Exu comeu tarubá
Exu é um termo africano utilizado de várias formas no Brasil, dependendo da pessoa que o emprega. Pode simbolizar um Deus do panteão Africano, um tipo de entidade espiritual que pertence a classe mais próxima do plano material, que acredito que seja o caso. Tarubá é uma bebida feita com mandioca ralada. O fato do Exu comer, significa que a oferenda foi aceita pela entidade.
e meteu a figa na mixira de peixe-boi.
Figa é um objeto que possui sincretismo religioso, usado normalmente contra inveja. Mixira é um tipo de linguiça feita com a carne de peixe-boi. O que simboliza uma oferenda para essa entidade espiritual, pratica comum em algumas religiões de descendência africana.
Aí na distância sem fim, moças foram roubadas,
Parece simbolizar que a oferenda tinha o intuito de conquistar mulheres.
e sóror Adelaide veio viajando de rede,
Sóror é uma forma de tratamento usada para designar freiras. Viajando de rede eu não consegui compreender, mas acredito que signifique que veio embalada e se seduziu pela magia
era alva ficou negra, era santa ficou lesa:
Nesse trecho o autor simboliza a religião cristã como alva e a religião africana como negra, indicando que o coração de Adelaide agora era da religião africana, tendo se convertido para a mesma.
caiu na madorna, o ar duro, gordo, oleoso.
Mais uma vez simboliza que entrou em transe.
Exu começou a babar a mixira de peixe-boi,
Simboliza novamente a aceitação da oferenda.
o professor tirou o pincenê: estava traído pelo donatário,
Pincenê é um óculos sem haste. Parece que o professor também aceitou a religião e passou a pertencer o culto.
sem barregãs, sem ginetes, sem escravos.
Barregãs são mulheres que não são casadas, mas vivem com homens. Ginete é uma cavaleiro, ou a sela. Acredito que simboliza o desprendimento dos pertences e do passado para praticar a religião.
Aí na distância sem-fim, viajando de rede
D.Diogo de Holanda veio parar na madorna,
D. Diogo de Holanda, simbolizando que até a nobreza foi seduzida pela prática da magia da religião africana.
o ar duro, gordo, oleoso.
Exu começou a lamber a mixira de peixe-boi:
Isabel Lopo de Sampaio desvirginou o moleque,
Jogou-se no rio, virou ingazeira, pariu três macacos.
Simboliza que ela se entregou as paixões religiosas, e teve três filhos. Não consegui compreender o virou ingazeira, mas acredito que signifique que fincou raízes, ou seja não conseguiu mais largar o culto.
Viajando de rede vieram três macacos parar na madorna,
Significa que o tempo passou e as crianças cresceram e também começaram a participar do culto religioso africano.
o ar duro, gordo, oleoso.
Eis aí três cirurgiões cosendo retrós,
a bela adormecida no século vindouro
que esquecerá por certo a magia
contra tudo que não for loucura
ou poesia.
Creio que simbolize o futuro do culto apresentado no poema.
Desta forma acredito que o Poema em si trata de determinado culto da região Nordeste, dados os termos apresentados. E nesse culto diversas pessoas foram atraídas, desde freiras, professores e duques da nobreza, todos fascinados pela magia e o ocultismo desse culto. Exaltando a cultura africana da região nordeste.
O que você acha? Bons Estudos!