Não sou de abandonar livros. Em geral, persisto até o fim, sempre na expectativa de que a obra ainda há de me oferecer algo de bom, mesmo não estando a leitura de todo agradável. Entretanto quando o livro perde o sentido para mim e prosseguir nele se torna totalmente sem proveito, deixo-o de lado.
Foi o que aconteceu nesse "Memórias de Carlota Joaquina". Adquiri o exemplar com certa expectativa, por considerar tal personalidade histórica interessante e também por já ter apreciado o livro anterior do autor ("A Biografia Íntima de Leopoldina"). Porém, já nas primeiras páginas o texto se mostrou decepcionante.
Para mim, o maior erro foi a narrativa em primeira pessoa. Esse recurso é muito utilizado em romances históricos, nos quais há uma certa abertura para criação de diálogos ou mesmo de cenas que não ocorreram na vida real. Quem adquire uma obra desse gênero já sabe disso. Contudo, lançar mão desse recurso em um livro que não se propõe a ser ficção é totalmente contraproducente.
Ora, se se trata de uma "biografia histórica" (como consta no verso), e não um "romance histórico", por que já traz, de cara, um elemento ficcional? Carlota Joaquina não escreveu suas memórias, então há ficção a partir do momento em que se revelam palavras, sentimentos, pensamentos, expressões e opiniões que se dizem terem sido redigidas por ela, mas não foram. Esse meio, ademais, limita demais a narrativa, uma vez que, se ela mesma estaria relatando, tudo ocorreria sob seu ponto de vista. E, por óbvio, é bastante indulgente consigo mesma e não tão bondosa com os demais. Dessa forma, o livro perde um elemento que considero essencial em obras históricas: a isenção.
Diante dessas circunstâncias, passei a desacreditar no que estava lendo, e o texto perdeu o sentido para mim. Faltam, ademais, dados mais precisos, tudo é muito solto, tratado de maneira superficial e sem uma análise mais detida dos fatos (e como poderia se tudo ocorre sob a ótica e avaliação de uma pessoa?).
As "polêmicas" envolvendo Carlota Joaquina (que não são poucas) são retratadas como falsas ou disfarçadas de boas intenções, sempre sob sua constante auto complacência.
Tive a impressão de que o autor quis passar uma imagem positiva de sua biografada, tratando-a como filha carinhosa, esposa fiel e devotada, pessoa injustiçada e vítima das maldades de quem não gostava dela. Mas, se quis fazê-lo, deveria ter usado a narrativa tradicional, em terceira pessoa, trazendo um estudo mais completo dos fatos e explicando, tecnicamente, por que os boatos seriam destituídos de fundamento. Contudo, inseriu um elemento sabotador da sua própria obra, o qual destruiu o que poderia ter sido um livro redentor. Uma pena.
Obs: na parte dedicada a mostrar imagens das personalidades apresentadas, há um erro quando se apresenta a Princesa do Brasil. Esse título, antes de pertencer a Carlota Joaquina, era de Maria Francisca Benedita de Bragança, a qual desposou seu sobrinho, D. José, irmão de D. João VI, e não teve filhos. A pessoa ali é retratada é Mariana Vitória, que também foi Princesa do Brasil, mas era avó dos dois príncipes citados, mãe de Maria I e Benedita, e esposa de D. José I, de quem teve quatro filhas. Pela legenda, deixa-se claro que está a se tratar de Benedita, e não Mariana.
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Não sou de abandonar livros. Em geral, persisto até o fim, sempre na expectativa de que a obra ainda há de me oferecer algo de bom, mesmo não estando a leitura de todo agradável. Entretanto quando o livro perde o sentido para mim e prosseguir nele se torna totalmente sem proveito, deixo-o de lado.
Foi o que aconteceu nesse "Memórias de Carlota Joaquina". Adquiri o exemplar com certa expectativa, por considerar tal personalidade histórica interessante e também por já ter apreciado o livro anterior do autor ("A Biografia Íntima de Leopoldina"). Porém, já nas primeiras páginas o texto se mostrou decepcionante.
Para mim, o maior erro foi a narrativa em primeira pessoa. Esse recurso é muito utilizado em romances históricos, nos quais há uma certa abertura para criação de diálogos ou mesmo de cenas que não ocorreram na vida real. Quem adquire uma obra desse gênero já sabe disso. Contudo, lançar mão desse recurso em um livro que não se propõe a ser ficção é totalmente contraproducente.
Ora, se se trata de uma "biografia histórica" (como consta no verso), e não um "romance histórico", por que já traz, de cara, um elemento ficcional? Carlota Joaquina não escreveu suas memórias, então há ficção a partir do momento em que se revelam palavras, sentimentos, pensamentos, expressões e opiniões que se dizem terem sido redigidas por ela, mas não foram. Esse meio, ademais, limita demais a narrativa, uma vez que, se ela mesma estaria relatando, tudo ocorreria sob seu ponto de vista. E, por óbvio, é bastante indulgente consigo mesma e não tão bondosa com os demais. Dessa forma, o livro perde um elemento que considero essencial em obras históricas: a isenção.
Diante dessas circunstâncias, passei a desacreditar no que estava lendo, e o texto perdeu o sentido para mim. Faltam, ademais, dados mais precisos, tudo é muito solto, tratado de maneira superficial e sem uma análise mais detida dos fatos (e como poderia se tudo ocorre sob a ótica e avaliação de uma pessoa?).
As "polêmicas" envolvendo Carlota Joaquina (que não são poucas) são retratadas como falsas ou disfarçadas de boas intenções, sempre sob sua constante auto complacência.
Tive a impressão de que o autor quis passar uma imagem positiva de sua biografada, tratando-a como filha carinhosa, esposa fiel e devotada, pessoa injustiçada e vítima das maldades de quem não gostava dela. Mas, se quis fazê-lo, deveria ter usado a narrativa tradicional, em terceira pessoa, trazendo um estudo mais completo dos fatos e explicando, tecnicamente, por que os boatos seriam destituídos de fundamento. Contudo, inseriu um elemento sabotador da sua própria obra, o qual destruiu o que poderia ter sido um livro redentor. Uma pena.
Obs: na parte dedicada a mostrar imagens das personalidades apresentadas, há um erro quando se apresenta a Princesa do Brasil. Esse título, antes de pertencer a Carlota Joaquina, era de Maria Francisca Benedita de Bragança, a qual desposou seu sobrinho, D. José, irmão de D. João VI, e não teve filhos. A pessoa ali é retratada é Mariana Vitória, que também foi Princesa do Brasil, mas era avó dos dois príncipes citados, mãe de Maria I e Benedita, e esposa de D. José I, de quem teve quatro filhas. Pela legenda, deixa-se claro que está a se tratar de Benedita, e não Mariana.